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quarta-feira, 2 de março de 2022

Nossa Humanidade - onde está?

 NOSSA HUMANIDADE - onde está?



Estamos vivendo dias difíceis enquanto acompanhamos a guerra. A Rússia, sob o comando de Vladimir Putin, invadiu a Ucrânia com tropas terrestres e bombardeia vilarejos e cidades de forma impiedosa. Cidadãos russos protestam e são presos. O mundo assiste e reage na base do dia a dia. Ameaças eram feitas, mas havia uma incredulidade que isto poderia acontecer. Todos podemos acompanhar a opinião de comentaristas, especialistas em geopolítica, história, economia, etc. Há "fake news" e fatos. Mortos, feridos, refugiados e heróis públicos e anônimos, como ocorre em todas as guerras, vão desfilando nos noticiários e nas mídias sociais.

Na foto acima chamamos atenção para dois fatos importantes. A cidade de Kiev, na capital da Rússia, foi bombardeada. O alvo principal foi a torre de comunicação. O uso da INTERNET tem sido intenso e o Presidente, outros membros do governo e parlamento, assim como a população em geral estão em todas as mídias. Informação, pedidos e atualizações permitem acompanhar quase em tempo real uma guerra que poucos poderiam antecipar. O Presidente Volodimir Zelensky tem liderado seus conterrâneos e vem informando o mundo por meio de transmissões esclarecedoras e ao mesmo tempo emotivas. Um ator e comediante que dispõe de uma "arma" nunca considerada: a capacidade de comunicar mantendo-se dentro de fronteiras que podem ser comprovadas. Toda a mídia, e o próprio Presidente Zelensky, destacam sua origem judaica. 

Olhem a parte de baixo da figura! Quase um século: este é o tempo que separa as duas imagens. Muito perto da Torre de Comunicação de Kiev está o local onde os cidadãos da Ucrânia, nos dias de 29 e 30 de setembro de 1941, mataram a tiros quase 34.000 judeus. Uma enorme vala cavada pelos homens serviu de sepultura para uma enorme parcela dos habitantes judeus de Kiev. Até a semana passada, existia no local um monumento para marcar esta data. Este monumento foi bombardeado junto com a Torre de Comunicação. 
Tempo e Espaço: o tempo pode ressignificar locais onde foram cometidas atrocidades? Minha resposta é positiva, mas a memória das atrocidades invadirão os novos tempos.

A história da região acima do Mar Negro é descrita desde a Antiguidade, quando os gregos expandiram para os territórios da Crimeia. A vida judaica na Ucrânia data do século IX, muito antes da existência de uma nação ucraniana ou da Rússia. Vale conferir a história até o início do século XX escrita quando a atual guerra não fazia parte nem da ficção (Revista Morashá, Julho 2014) Na época era contada a saga dos judeus nas terras que seriam a Ucrânia e dentro deste território durante o Império Russo e a União Soviética. Atenção especial para a menção de correspondência encontrada na Guenizá do Cairo que data do século XX, a importância do Reinado da Polônia-Lituânia, o estabelecimento da Arenda (arrendamento) para os judeus e o Chassidismo. Em todos estes tempos o antissemitismo esteve presente.

Os judeus que emigraram da Ucrânia e das terras do Leste Europeu foram para todos os países do Globo. Muitos se estabeleceram no Brasil e, mantendo a diversidade judaica, seus decendentes pertencem aos mais diversos ramos do judaísmo ou abandonaram sua identidade. Nesta semana o jornalista Arnaldo Bloch escreveu o artigo "A Ucrânia Existe?" relembrando o que escutava dos imigrantes do início do século XX, quando esta região fazia parte do Império Russo. 

Como será contada a memória dos dias de hoje? Yuval Noah Harari, Professor de História da Universidade Hebraica de Jerusalém e da Universidade de Oxford, voz que se destaca na capacidade de unir conhecimentos científicos e a história da humanidade, publicou um texto nesta semana que nos dá a dimensão desta relação. Harari escreve como cidadão do mundo e compartilha de toda a nossa indignação ao ver humanos contra humanos perpetrando uma história de horrores em pleno século XXI. Ao mesmo tempo, expressa com primor a admiração por um Presidente que criou uma forma importante de defesa e empoderamento. Um povo que sabe ser resiliente e lutar contra uma força muito maior. 
 
"O presidente que se recusou a fugir da capital, dizendo aos EUA que precisa de munição, não de carona; os soldados da Ilha das Cobras que mandaram um navio de guerra russo “vá se foder”; os civis que tentaram parar os tanques russos sentando-se em seu caminho. Este é o material de que as nações são construídas. A longo prazo, essas histórias contam mais do que tanques." O texto completo está aqui.

A guerra sempre é acompanhada de ações que permitem vislumbrar nossa identidade como humanos. Esta vem sendo expressa por muitos e aqui destacamos os esforços dos judeus e do Estado de Israel. Vejam a foto abaixo.
(As reações do mundo estão disponíveis na grande mídia).

A longa relação entre as comunidades judaicas do mundo e o grande número de ucranianos que emigraram para Israel e outros países cria laços pessoais que impulsionam ações humanitárias. A este contingente também têm que ser incluídos os israelenses não judeus que estavam na Ucrânia a trabalho, estudando ou mesmo visitando.

É neste contexto que podemos observar ações pessoais e governamentais que têm a preocupação de criar condições de sobrevivência e resgate. Na figura acima destacamos judeus ucranianos incorporados ao exército e, ao contrário do que ocorria há 1 século, hoje podem se expressar livremente. Os ortodoxos podem inclusive seguir com os rituais, mantendo a sua identidade. 

Nas várias cidades ocupadas pelo exército russo em que há sinagogas, estas abrigam crianças e adultos, judeus e não judeus. A proteção contra os bombardeios é o primeiro foco, mas em paralelo está sendo desenvolvida uma grande ação humanitária para alimentar e criar condições de cruzar fronteiras vizinhas. Nos relatos de muitos, o objetivo não é a imigração, mas sim a proteção temporária.

A estimativa do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados é que nos últimos sete dias saíram da Ucrânia cerca de 841.000 pessoas. Para ajudar nesta situação o Estado de Israel está enviando aviões com alimentos, roupas e  equipamentos para atendimento médico para os países vizinhos e para a Ucrânia. Equipes médicas treinadas e de socorristas também estão chegando.

Há ainda uma ação que visa a volta de cidadãos israelenses e a facilitação para o recebimento de ucranianos judeus. A Ucrânia tem um sistema de Universidades que atrai pessoas de todo o mundo. Muitos palestinos que moram fora do Estado de Israel também precisam voltar para suas residências. Muitos têm feito declarações na rede declarando que sua volta está sendo facilitada pelo governo israelense. 

Pessoas que falam com pessoas e preocupam-se com pessoas - este é um ponto essencial para a humanodiversidade! Somos todos diferentes - mas somos responsáveis uns pelos outros - e quem disso esquece ...

Olhando as cores da bandeira da Ucrânia - 🇺🇦 Azul e Amarelo - olhando as cores com que o Escudo de David (Maguen David), conhecido em português como a estrela de David - foram pintadas: há um século, os que esperavam nas estações de trem eram separados e enviados para os campos de extermínio e trabalho forçado. Hoje, o escudo azul representa proteção e acolhida.

A retórica do Certo e Errado sempre nos levará à GUERRA. As ações que admitem que cada um de nós, seres humanos, somos diferentes e que devemos respeitar nossas identidades, abrirão portas para a convivência, o debate e... o que mais? O FUTURO DIRÁ. 


Regina P. Markus


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