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segunda-feira, 19 de setembro de 2022

VOCÊ SABIA? - Sinagoga com chão de areia?

 

Shaar Shalom, na Jamaica: uma das poucas sinagogas caribenhas com um chão que abafa o som de passos.

Por Itanira Heineberg



Você sabia que, com a maldade e injustiça da Inquisição no final do século XV, todos os judeus que puderam fugir da península ibérica levaram consigo sua religião, seus livros, torás e objetos sagrados e construíram suas próprias sinagogas em vários recantos do mundo?

Os judeus jamaicanos hoje constituem uma pequena, mas vibrante comunidade religiosa estabelecida atualmente na capital de Kingston.

 

 “Enquanto o núcleo da comunidade traça sua ascendência à Península Ibérica e ao êxodo judaico que começou no final do século XV, os judeus jamaicanos hoje vêm da Polônia, França, Itália, África, Israel, Turquia e muitos outros lugares. Eles têm suas próprias receitas exclusivas para os pratos tradicionais jamaicanos mais amados - incluindo ackee e peixe salgado, bammy frito (um pão achatado de mandioca), fruta-pão, e outras guloseimas típicas - e sua principal sinagoga é uma de apenas um punhado no mundo com um piso de areia.

Enquanto cerca de 22.000 judeus viviam na ilha, a população judaica hoje é de apenas cerca de 450 pessoas.”

 

As origens destes judeus divergem: de Portugal, onde foram traídos pelo rei D. Manuel I da Espanha, já fugindo nas naus de Cristóvão Colombo; das colônias portuguesas de Hamburgo, Londres, Livorno; de Amsterdã para o nordeste do Brasil, especificamente Pernambuco, onde viveram em paz durante o governo de Maurício de Nassau, um nobre holandês que dirigiu a colônia lá estabelecida pela Companhia das índias Ocidentais até serem expulsos pelos portugueses em 1654.

Em 1655 os britânicos colonizaram a Jamaica e uma nova onda de imigrantes judeus para lá se dirigiu.

 

“Sob os britânicos, tornou-se legal praticar o judaísmo, o que por sua vez levou ao estabelecimento da primeira sinagoga da ilha em Port Royal, um movimentado centro comercial conhecido como base de piratas. Pouco se sabe sobre esta sinagoga, que foi destruída junto com grande parte da cidade em um terremoto e tsunami em 1692.”

Lápide de cemitério com letras judaicas e o símbolo dos piratas - caveira com dois ossos.


Muitos judeus foram expulsos de suas propriedades praticamente com a roupa do corpo, viajando fugitivos nos navios pelo Oceano Atlântico. Sem posses, sem documentos, bastardos e sem pátria, ficaram conhecidos como vagabundos, muitos unindo-se aos piratas europeus que os aceitavam e com eles partilhavam os lucros das conquistas. E assim, nas ilhas do Caribe, criaram uma vida nova e fortaleceram-se, tornando-se piratas orgulhosos de suas origens, encontrando uma liberdade que na Europa dominada pela Inquisição já não possuíam.

E com os resultados de suas conquistas marítimas, ajudavam os judeus mais pobres e a comunidade de um modo em geral, sempre obedecendo o preceito judaico primordial de praticar a caridade e seguindo ”kol Israel arezim ze baze” , outro preceito judaico que aprendi com nosso colega Guilherme Susteras, “cada um é responsável por aqueles ao seu redor”.



“Unindo-se às naus piratas de holandeses e ingleses, tomavam os produtos de saques espanhóis e portugueses roubados dos indígenas e povos pré-colombianos do México, das Antilhas e da América do Sul, principalmente ouro, prata e diamante, a fim de que estes tesouros não chegassem às mãos de governantes da península Ibérica e Itália, que eram comandados pela Igreja, com consequente enriquecimento desta. Era a vingança contra todos e tudo que passaram na Europa, constituindo um verdadeiro golpe contra as gloriosas armadas espanhola e portuguesa, ditas como invencíveis, espalhando terror entre todos.”


De mercadores, intelectuais e astrônomos a intrépidos aventureiros nos mares do Caribe... uma desforra inusitada...


Já no século XXI, Edward Kritzler pesquisava a história de Jamaica na Biblioteca Nacional da capital quando se deparou com uma interessante narrativa de 1642 no diário de William Jackson, um pirata britânico. Ali, ele relata o encontro na ilha com judeus portugueses que sub-repticiamente se ofereceram a desvendar o local onde os espanhóis guardavam suas riquezas.

Edward aprofundou seus estudos e em 2008 publicou o livro “Piratas Judeus do Caribe” onde relata todos os acontecimentos humilhantes e dolorosos pelos quais os judeus passaram com a Inquisição e os caminhos que estes judeus percorreram para se salvar, recomeçar uma nova mas santa vida e proteger seus descendentes. E na sequência da história, Edward apresenta a saga daqueles que se lançaram ao mar como uma opção de sobrevivência.

Ali aparecem os irmãos Abraão e Moisés Cohen Henriques, Yaakov Koriel e David Abravanel, judeus ‘Portugueses’ ao lado dos holandeses ou dos ingleses contra os espanhóis, a Inquisição e o Santo Ofício. É interessante lembrar que estes piratas observavam o Shabat, elevavam sinagogas com solos arenosos para os serviços e nomeavam seus veleiros de “A Rainha Ester”, “O Profeta Samuel” ou “Escudo de Abraão”.



Sob a areia do solo existe sempre um bom soalho de madeira como suporte e de anos em anos deve-se acrescentar mais areia para repor aquela consumida com o movimento das pessoas.

De onde surgiu esta prática?

Não há uma resposta definitiva, e as explicações variam: talvez a origem seja Amsterdã onde usava-se areia para secar o barro dos sapatos dos participantes, há quem diga que a areia lembra o terreno do deserto por onde os judeus vagaram por 40 anos, mas a mais aceita é simplesmente que a prática se originou no Brasil, no início de 1600, quando os convertidos que voltaram ao Judaísmo optaram por manter os costumes de seus familiares.

 


O que será que pensam estas pessoas ao pisar na areia de sua sinagoga?

Lembram a história das perseguições? Estranham este costume? Agrada-lhes esta sensação de liberdade que a areia da praia nos traz?

Nesta sinagoga abrangente encontramos mais uma vez a beleza do Judaísmo, a diversidade de pessoas, sítios geográficos, edificações... sempre sob a palavra da Torá, e a fidelidade a um só D’us!


Crianças da Sinagoga em 2015, um templo progressista que a todos acolhe sempre a lembrar da história de seu povo e de suas adversidades!


FONTES:

https://www.myjewishlearning.com/article/the-jewish-community-of-jamaica/?utm_content=bufferd4423&utm_medium=social&utm_source=mjlfacebook&utm_campaign=buffer&fbclid=IwAR3hmCL0JLEU45hp7SlUg-Jw7BbYuQQbV-jBDaqpI8x-drJHGqsT8doo8UY

https://www.jewsofjamaica.com/articles/united-congregation-mission

https://www.facebook.com/ucijamaica/

https://www.lonelyplanet.com/jamaica/kingston/attractions/shaare-shalom-synagogue/a/poi-sig/1421629/358074

https://cityseeker.com/kingston/76823-shaare-shalom-synagogue

https://yellow.place/pt/shaare-shalom-synagogue-kingston-jamaica

https://anussim.org.br/piratas-ou-usurpadores-judeus-do-caribe/

https://www.shavei.org/pt-br/blog/2021/05/27/piratas-judeus-no-caribe/

https://journals.openedition.org/lerhistoria/5043

http://zivabdavid.blogspot.com/2012/02/piratas-judeus.html

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