Dia
desses eu entrei ali pelo Parque da Água Branca. Estava na feirinha de
orgânicos. Céu azul, aquela paz no meio do Arraiá do Chico Bento.
De
repente, bateu um vento mais forte, meio de lado, meio redemoinho, e levantou
as folhas secas do chão. Foi uma coisa de segundos, aquele redemoinho marrom e
silencioso.
Na
hora, a cabeça viajou longe.
Voltou
pra um tempo que nem sei, lá na infância, no Parque dos Eucaliptos, em Jacareí.
Eu, moleque, com uma peneira de fubá na mão, correndo que nem um louco atrás
daqueles mesmos redemoinhos.
Os
“antigo”, contava a Dadaia, ensinavam que ali dentro morava o saci.
Claro
que eu nunca peguei nada... Ou será que peguei?
O
vento passava pelos buracos, as folhas caíam e eu ficava lá, com cara de tacho
e a peneira vazia na mão.
Pois
é. Vendo aquela cena no Água Branca, me caiu uma ficha. Era o saci me dando uma
moral nova...
A
gente cresce e continua correndo com a peneira na mão. Só que em vez de saci, a
gente tenta caçar a opinião dos outros. A gente quer, na marra, mudar o que a
pessoa pensa, arrancar um preconceito, enfiar uma ideia nova na cabeça dela.
E
o que acontece? A gente fica com a peneira vazia. Assim, ó... Com cara de
bundão!
Aí
que tá o pulo do gato. O preconceito, a ideia antiga, não é uma folha seca boba
que o vento carrega. É tipo uma pedra bonita, um mineral que a pessoa foi
guardando a vida inteira, lá no fundo da alma. Lembra do Césio 137?
Foi
o pai que deu, o avô que ensinou, a vida que maltratou... A pessoa cuida
daquilo como se fosse um tesouro. Chegar com a peneira do "eu estou
certo" pra arrancar o tesouro do outro? Não funciona. A pessoa se fecha,
se arma, se defende.
É
sempre assim! Lembra daquela história do Faraó no Egito? Cada vez que Moisés
chegava com uma ameaça, uma praga nova, o coração do homem endurecia mais. Tá
na nossa programação, no nosso DNA: quando alguém vem pra cima da gente com
força, a gente cria um casco, vira tatu-bola.
Por
isso que as ideias novas não podem ser um trator que passa por cima de tudo.
Elas têm que ser como a chuva fininha, que vai molhando a terra aos poucos, de
geração em geração. É a Educação, com "E" maiúsculo. É o respeito
pela bagagem que a pessoa traz.
Como
dizia o sábio Janusz Korczak, pra cuidar do futuro, a gente tem que cultivar o
presente das crianças.
Inovação,
no fim das contas, não é destruir o que veio antes.
É
pegar a casa antiga, com seu alicerce forte, e construir um quartinho novo, com
uma janela maior pra entrar mais luz. Só dá pra negociar de verdade, pra mudar
o mundo um tiquinho que seja, se a gente tiver essa paciência de agricultor.
Paciência,
Educação e respeito pela Tradição.
Fiquei
lá parado, vendo as últimas folhas assentarem no chão.
Pensei
que talvez essas reflexões, essa saudade, essa clareza que me bateu... talvez
não sejam só coisa da minha cabeça. Talvez sejam as vozes do saci que eu nunca
peguei, a resposta que o vento sempre me deu...
André
Naves
Defensor
Público Federal. Especialista em Direitos Humanos e Sociais, Inclusão Social –
FDUSP. Mestre em Economia Política - PUC/SP. Cientista Político - Hillsdale
College. Doutor em Economia - Princeton University. Comendador Cultural.
Escritor e Professor.
Conselheiro
do Chaverim. Embaixador do Instituto FEFIG. Amigo da Turma do Jiló.
www.andrenaves.com
Instagram:
@andrenaves.def
Que lindo acompanhar tua historia!!obrigada por compartilhar!
ResponderExcluirQue lindo acompanhar tua historia! Obrigada por compartilhar!
ResponderExcluirConcordo com a Marcela. Eu gostaria de ter esse talento!
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