Por Itanira Heineberg
Quilombolas
em suas comunidades mais de 100 anos após a abolição da escravatura no Brasil |
VOCÊ SABIA que os quilombos brasileiros abrigavam, além dos escravos escapulidos das
fazendas de seus patrões, também judeus fugidos da Inquisição?
Capitão do Mato – encarregado
de recuperar os escravos fugitivos |
O Rabino
Jayme Fucs Bar teve uma experiência interessante em 2019 quando dois amigos
seus, com um grupo de jornalistas, visitaram o Kibbutz Nachshon para ali fazer
uma entrevista sobre a comunidade. Havia no grupo duas mulheres que atuavam no
Movimento Negro e assim, afastado há muito do Brasil, Jayme aproveitou o
encontro para aprofundar seus conhecimentos sobre a questão dos negros no
Brasil.
Conversando
sobre este assunto delicado e doloroso para a história do nosso país, Jayme
lembrou-se de outro encontro que lhe chamara muito a atenção, mas que, apesar
de surpreendente, ele até então não havia divulgado:
“Aconteceu
já há alguns anos, quando recebi uma família de Minas Gerais, pessoas realmente
muito especiais com quem tenho contato até hoje, que nasceram e foram criados
num Quilombo de nome Moinho. Nesse dia estávamos viajando em direção ao Mar
Morto e na viagem eles me contavam a história do Quilombo de Moinho, as suas
tradições, e como sobreviveram como uma sociedade fechada por mais de 400 anos.
O que
mais me impressionou foi a frase de uma das integrantes do grupo que me disse:
"Você
está vendo que eu tenho a pele parda, apesar de a maioria das pessoas do Quilombo
de Moinho serem Negros? “Eu tenho sangue de Judeu!”
Eu não
entendi nada, e perguntei - “Como assim? “
“Sabe
Sr. Jayme, eu sei que é difícil acreditar, mas no nosso Quilombo existe uma
história que foi passada por cada geração de que os brancos que chegaram
fugidos no quilombo eram foragidos por não acreditarem na religião católica. Hoje,
que temos mais informações e conhecimentos, chegamos à conclusão de que eram os
Cristãos Novos que foram denunciados por ter prática Judaica!”
Fiquei
realmente impressionado com a afirmação da senhora. Estava dirigindo o carro
com mais 5 pessoas e não me contentei; logo que vi um posto de gasolina ainda
no meio da estrada resolvi parar o carro para entender melhor essa história
realmente incrível.
Com
carro já parado, olho para todos e vejo que estão sorrindo com forma de aprovar
o que ela acabou de me contar!
Esse
trabalho de guia é muito gratificante; muitas vezes, acho que eu que deveria
pagar para receber tanto aprendizado das pessoas que encontro nessas viagens!
Conviver com seres humanos é uma eterna aprendizagem!
Ainda
mais esse privilégio de ouvir essa história de pessoas que viveram num Quilombo
em Minas Gerias e ouvir de suas bocas que judeus viveram juntos com os negros
nos Quilombos.
Isso me
fez pensar que realmente tem muita lógica no que a Senhora e todos me relataram
no carro. Os judeus portugueses que viveram no Brasil colônia, quando foram
denunciados por suas práticas judaicas e persuadidos não tinham muita escolha
entre ser torturados e queimados na fogueira ou decidir fugir. E onde poderiam
encontrar um lugar com certa segurança? Somente nos Quilombos, junto aos negros
foragidos da escravidão.
Os
Quilombos provavelmente eram pequenos estados muito bem organizados com leis e
regulamentos próprios, que definiam a forma de viver e de se comportar, onde as
pessoas tinham funções domésticas, agrícolas e militares.
Se
acredita que cada Quilombo tinha sua própria liderança e provavelmente as
decisões eram tomadas em assembleias - e a vida era na base do coletivismo.
Hoje entendo
que os Quilombos não somente abrigavam negros, mas também judeus perseguidos
pela inquisição.
Fico
imaginando que quando os Quilombos foram atacados e destruídos, negros e judeus,
uns ao lado dos outros, lutaram até a morte por sua liberdade!
No dia
20 de novembro, o dia da Consciência Negra no Brasil, nós, judeus, precisamos
estar presentes e agradecer a esses heróis Negros dos Quilombos que nos deram
abrigo e nos protegeram contra a tirania da Inquisição Católica.
No final
da viagem fiz um pedido pessoal a essa família: que no dia que eu visitasse
Minas Gerais pudesse conhecer o Quilombo do Moinho para agradecer de perto essa
gente humilde que jamais devemos deixar de reconhecer por nos abrigarem e lutarem
por nossa liberdade.”
Onde os
habitantes da África foram escravizados sempre surgiram quilombos – seus esconderijos.
“No
continente americano e nas colônias inglesas tinham o nome de maroons; nas
francesas, grand marronage; na América espanhola, cumbes e palenques e, na
América portuguesa, eram chamados de quilombos e mocambos.”
Entre os
séculos XVI e XIX, o Brasil foi o maior importador de escravos do continente, e
os maus tratos e torturas infligidos aos africanos ocasionaram o grande
movimento de fuga dos prisioneiros e a criação dos quilombos.
Cinco
milhões de africanos deixaram sua pátria para ser escravizados no Brasil.
A Capitania de Minas, a mais rica da
América portuguesa, percebia a força destes quilombos cada vez mais numerosos e
apoiados até mesmo pelos brancos, donos das vendas. Os escravos das fazendas
passavam belas informações aos fugitivos, tal como onde poderiam roubar alguma
mercadoria de maneira fácil e eficiente. Os quilombolas escondiam-se nas
florestas, atacavam os viajantes e deles roubavam a carga preciosa para a
alimentação e defesa dos seus mocambos.
Em 1719 uma guerra de nervos afligiu a
população de Minas, por toda a capitania ouvia-se falar em um ataque saindo dos
quilombos, uma revolta iminente aconteceria durante os feriados religiosos
quando os senhores brancos estariam nas igrejas reverenciando seu Deus e
patronos.
Como consequência, mais castigos eram
adicionados aos escravos fugitivos, e quando recapturados perdiam uma orelha ou
eram carimbados com ferro quente ou iam para o pelourinho.
Representações de africanos
escravizados de diferentes origens e regiões — Foto: Fundação Biblioteca
Nacional |
“Essas populações vindas da África carregaram uma cultura e um conhecimento que ainda é pouco percebido entre nós. Foram os africanos que trouxeram para as Minas a tecnologia da metalurgia e mineração do ouro. Grandes artesãos e artífices injetaram valores culturais e objetos de materiais africanos que ofereceram um contorno afro-brasileiro à ourivesaria colonial. Há um diálogo muito complexo de culturas africanas que aparece na formação de Minas Gerais. O Brasil é um país extraordinariamente africanizado. E só a quem não conhece a África pode escapar o quanto há de africano nos gestos, nos sons, nas maneiras de ser e de viver e no sentimento de liberdade do mineiro que somos hoje.”
FONTES:
Itanira uma aula de conhecimentos, uma reflexão de uma realidade desconhecida. obrigada . bj
ResponderExcluirAgradeço ao povo Quilombola ter abrigado e integrado judeus ao seu convívio dando lhes guarida, alimento e água.
ResponderExcluirD"us os abençoe sempre ��