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sexta-feira, 29 de julho de 2022

Editorial - MULHERES: quebrando paradigmas ao longo da história

 



Por Regina Pekelmann Markus


Um dos focos de nossa newsletter* é a divulgação de processos discriminatórios. Há momentos em que fazemos denúncias e outros em que mostramos exemplos altamente positivos; sabemos que os comportamentos variam ao longo da história, mas também tem um componente ligado a cada sociedade, ou a cada civilização. Quando pensamos na inclusão da mulher nas sociedades temos também olhares múltiplos. Há grupos que admitem e fomentam a postura de igualdade de gênero, enquanto outros vêm substituindo o conceito de igualdade por equidade. Ser diferente ganha uma conotação positiva e não mais uma desvantagem frente a um grupo de privilegiados.

Na última semana a parashá (porção) foi Pinchas (lê-se Pinrrás) (números 25:10 – 30:1). Nela é contada a história das filhas de um homem que morreu no deserto deixando cinco filhas: Machla, Chagla, Noa, Milca e Tirtsa. Ao ser dividida a Terra de Israel entre os líderes de cada tribo, Tselofchad, morto no deserto e que só tinha filhas, foi preterido. As filhas, então, reinvidicam a posse de terra argumentando que o nome de seu pai será esquecido só porque não teve filhos homens. Moisés consulta o Sumo Sacerdote e a Assembleia de Anciãos – e todos acham que as mulheres não podem herdar. Mas a consulta de Moisés com D’us altera este resultado: as cinco moças receberão um pedaço de terra, e seus filhos portarão o nome de seu pai, de forma que este não seja apagado da Terra. 

Discriminação contra a mulher é um fato em muitas civilizações. Movimentos de igualdade e de equidade surgem ao longo dos séculos. É como tocar música em um acordeão. O som depende do tamanho do fole – as conquistas e as perdas vão se sucedendo.

Há na história judaica muitas mulheres que são relatadas, as matriarcas, profetizas dos tempos bíblicos, mulheres que na idade antiga lideravam caravanas comerciais e também as que se distinguiam na Idade Média como gestoras. Nos séculos mais recentes encontramos cientistas, filósofas, economistas, líderes políticas. Mulheres com nomes e também sem nomes. 

O reconhecimento da relevância da mulher entre os chalutzim, que chegaram a Israel vindos da Europa Oriental no século XIX, embasa a posição da mulher no Estado de Israel moderno.

Elas e eles dividiam responsabilidades e atividades. Foram criadas facilidades para bebês e crianças de forma a dar condição de trabalho às mães. E estas mantém-se até hoje.

Israel atual tem mulheres em todas as posições-chave da vida política, militar, universitária, de negócios, finanças, etc. Aqui no Brasil, a maioria dos cargos de liderança já foram ou são ocupados por mulheres. Mas aqui, como lá, a mulher ainda é um tema importante nas áreas de discriminação e deslegitimação. 

Nesta semana em que a Torah dá “um ponta pé” inicial no tema "Mulher", e quando as comunidades judaicas ao longo do mundo focam na matéria, incluo um post disponibilizado pelo Guilherme Susteras da Esh Tamid que resgata as mulheres profetizas. Vale conferir as muitas mulheres.




Conhecer as fontes e os nomes de cada mulher é altamente relevante, mas hoje deixo para ver estes nos comentários. Quero desafiar aos nossos leitores a pensarem e comentarem suas opiniões e visões sobre as questões de mulher no mundo em que cada um de nós vivemos.

MULHER – um tema sempre presente e que merece um olhar histórico “leve”, um olhar que aproxime o que vivemos com o que nossos antepassados viveram para que as bases a serem lançadas para o futuro não sejam desfocadas pelo presente.


Boa semana!

Regina P. Markus



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segunda-feira, 25 de julho de 2022

VOCÊ SABIA? - Anton Schmid

 

“Eu apenas me comportei como um ser humano ...”

Anton Schmid - 1900 Viena – 1942 Vilnius. Um Justo entre as Nações.


Por Itanira Heineberg




Você sabia que graças ao reconhecimento de condenados por ele salvos, ficamos conhecendo a história de Anton Schmid, um sargento alemão que não aceitou a barbárie de seus superiores nazistas, resgatou os perseguidos judeus dos campos de extermínio e acabou executado em 13 de abril de 1942?

Na Lituânia ocupada pelos nazistas, este oficial alemão desobedeceu a seus dirigentes salvando 250 judeus (mulheres, homens e crianças) ao escondê-los, fornecer-lhes proteção e documentos falsos que lhes permitiram escapar da tragédia reinante durante o Holocausto.

Em meados de 1941 iniciou-se na Lituânia uma campanha genocida de assassinato em massa e deportações para campos de extermínio, eliminando cerca de 180 mil judeus em três anos. Foi uma ação nazista de destruição da vida cultural, intelectual e política judaica da Europa.

Hoje há apenas 6 mil judeus no país.

Esta história de “humanidade corajosa” chegou ao meu conhecimento por um belo texto de Sérgio Campregher:

 

Anton Schmid possuía uma pequena loja de rádios em Viena. Após a Anschluss (anexação) de 1938, o eletricista foi convocado para o exército alemão, sendo posicionado cerca de Vilnius, capital da Lituânia, no outono de 1941.

Sargento da Wehrmacht, presenciou o tratamento dado a judeus em dois guetos e o fuzilamento de milhares deles nas proximidades de Ponary.

Em uma carta para sua esposa, Stefi, descreveu seu sofrimento ao ver o “assassinato em massa e as crianças sendo espancadas no caminho". Ele continuou: "Você sabe como meu coração é mole. Eu não conseguia pensar e tive que ajudá-los."

‘Eu quero te contar como tudo isso aconteceu. Os militares lituanos arrebanharam muitos judeus para um prado fora da cidade e atiraram neles, cada vez cerca de duas mil a três mil pessoas. No caminho eles mataram as crianças jogando-as contra as árvores, etc., você pode imaginar.’

- Anton Schmid em uma carta à família, 9 de abril 1942

 

No início de setembro de 1941, 3.700 judeus de Vilnius foram presos e mortos fora da cidade, nos poços de extermínio de Ponary.

Do ponto onde estava, Schmid deparou-se com cenas de muita brutalidade e não abandonou quem o procurou.

 

“O primeiro judeu a quem ele ajudou foi Max Salinger, um judeu polonês de Bielsko Biala fluente em polonês e alemão; muito provavelmente Salinger se aproximou de Schmid. Schmid deu a Salinger a caderneta de pagamento do soldado Max Huppert, um soldado da Wehrmacht que havia sido morto, e o empregou como datilógrafo no escritório.”

 

E Salinger sobreviveu. Mais tarde, ele visitou a esposa de Schmid contando-lhe tudo o que se passara com ele e a apoiou financeiramente.

 

“A segunda judia que Schmid resgatou era uma jovem lituana de 23 anos chamada Luisa Emaitisaite. Ela foi pega do lado de fora do gueto após o toque de recolher, que era punível com a morte. Escondida em uma porta, ela viu Schmid passando e implorou por sua ajuda. Schmid a escondeu temporariamente em seu apartamento e depois a contratou para o escritório, onde seu conhecimento de vários idiomas e estenografia foi útil. Sua permissão de trabalho a protegeu e ela também sobreviveu à guerra.”

 

E assim se seguiram as ajudas na seção de carpintaria e estofamento que Schmid dirigiu nos territórios conquistados, no seu próprio escritório, e no transporte de judeus nos caminhões da Wehrmacht até a cidade próxima de Lida, Bielorrússia, onde estariam mais seguros. 

Schmid também conseguia multiplicar mais e mais licenças para salvar vidas, recrutando mais de uma centena de judeus em vários empregos.

Segundo testemunhos prestados, Schmid tratou seus trabalhadores sem distinção - tanto judeus como prisioneiros de guerra soviéticos - humanamente - e até conseguiu resgatar alguns que foram levados para a prisão de Lukiškės para execução.

 


Schmid também escondeu Hermann Adler, judeu nascido em Bratislava, membro da resistência, e sua esposa Anita em seu apartamento em Vilnius de novembro de 1941 até janeiro de 1942, quando foi preso. O apartamento de Schmid também serviu de ponto de encontro de guerrilheiros judeus.

 

Em uma declaração a Hermann Adler, Schmid falou:

 

“Todos nós devemos morrer. Mas se posso escolher morrer como assassino ou como ajudante, escolho ajudante.”

 

Ao ser descoberto como participante do movimento de resistência judaica, Schmid foi preso no início de 1942 e ficou detido na prisão Stefanska em Vilnius, sendo condenado à morte em 25 de fevereiro do mesmo ano nos termos do artigo 90 do código penal militar e do artigo penal do Reich. A acusação era ter ajudado judeus a fugirem do gueto. Assim, foi executado em 13 de abril de 1942 e sepultado na orla do cemitério militar Vilnius-Antokol.

No julgamento de Eichmann em Israel seus feitos vieram à tona e todos ficaram cientes da generosidade deste homem que ao ajudar outros, arriscava sua própria existência.

Em seu livro “Eichmann in Jerusalem”, Hannah Arendt escreve:

 

“Durante os poucos minutos que Kovner levou para contar sobre a ajuda que tinha vindo de um sargento alemão, um silêncio tomou conta do tribunal; era como se a multidão tivesse decidido espontaneamente observar os habituais dois minutos de silêncio em homenagem ao homem chamado Anton Schmid. E naqueles dois minutos, que foram como um súbito clarão de luz no meio de uma escuridão impenetrável e insondável, um único pensamento se destacou claramente, irrefutavelmente, sem dúvida – quão completamente diferente tudo seria hoje neste tribunal, em Israel, na Alemanha, em toda a Europa, e talvez em todos os países do mundo, se ao menos mais histórias desse tipo pudessem ser contadas.”



Abba Kovner ao centro, julho de 1944, com judias partisans em Vilnius, depois da liberação da cidade, por eles reconquistada dos alemães.

Kovner nasceu na Rússia em 1918 e estudou em Vilnius, considerada a Jerusalém da Europa.

Participou do movimento Ha-shomer e ao escutar das execuções desumanas dos nazistas perto de Ponar, organizou grupos de guerrilheiros judeus e iniciou a resistência judaica que durou até o final da guerra. Segundo ele, judeus deviam lutar como judeus, criando seus próprios grupos ao invés de participar de grupos de russos ou lituanos.


Anton Schmid, “um dos poucos e mais poderosos exemplos de resistência ao terror totalitário”, passou então a receber homenagens, sendo declarado Justo entre as Nações pelo Memorial de Yad Vashem em 1964 quando sua viúva recebeu a medalha e o certificado de honra pelas mãos do embaixador de Israel na Áustria.

 

Em 1968 um documentário intitulado Sergeant Achmid foi transmitido pelo canal de televisão alemão ZDF.



Sargento Anton Schmid: Um Herói da Humanidade, por Wolfram Wette



Israel, o cruzamento Anton Schmid, da rodovia na entrada sul de Haifa

 

Monumentos e homenagens a um homem simples que seguia seu coração, sentimentos e crenças.



Anton Schmid, um Herói Austríaco

 

 

FONTES:

SÉRGIO CAMPREGHER

http://www.auschwitz.dk/Schmid/Schmid.htm

https://aurora-israel.co.il/anton-schmid-el-hombre-que-eligio-no-ser-indiferente/

https://www.ecured.cu/Anton_Schmid

https://dirkdeklein.net/2017/07/19/anton-schmid-austrian-hero/


domingo, 17 de julho de 2022

Editorial - Lembrando para não esquecer nunca... é suficiente?

 

Lembrando para não esquecer nunca... é suficiente?

De 18 de julho de 1994 até 18 de julho 2022 = 28 anos


 




Foi uma manhã como qualquer outra: acordar, tomar banho, tomar café e sair com os meninos para dar aula na escola... e aí, de repente, tudo ficou interrompido. O atentado. As ruas fechadas, as ambulâncias, os hospitais... eu sendo a única professora judia na escola, veio a pergunta óbvia: ”você tinha algum conhecido lá?”

E tinha sim! Julia Susana Wolinsky Kreiman, Shoshana, como a gente chamava, esposa do rabino Angel que foi colega do meu marido Raul no Seminário Rabínico Marshall Meyer.

A gente escutava os nomes daqueles que era resgatados vivos ou mortos e eu sentia dor, sentia angústia, sentia raiva, sentia desolação.... novamente um atentado... quando será que viveremos tranquilos?

Quantas vezes teremos que sentir que somos alvo do terror? Quantos Kristallnacht (1938), anos de Holocausto (1939-1945), morte dos atletas israelenses nas Olimpíadas  de Munique (1972), atentado na sinagoga em Tunez (2002), Cemitério Judaico e sinagoga de Istambul (2003), na Escola Judaica da Franca (2012), no Centro Cultural Judaico em Copenhagen (2015), na Sinagoga de Pittsburg (2018), só para lembrar de alguns?

Quando será que encontrarão, levarão à justiça e condenarão os responsáveis?

Lamentavelmente, 28 anos depois do atentado à AMIA (Associação Mutual Israelita de Argentina) em 18 de julho de 1994 - o maior atentado a uma comunidade judaica na América Latina - nada ficou resolvido e nem há a menor chance de que algumas das duas situações aconteça.

Foram culpados agentes da Policia Federal de Buenos Aires, trocados juízes federais, existiram solicitações oficiais de vários lugares diferentes.

Até o atual Papa Francisco solicitou formalmente, como Cardeal de Buenos Aires na época, uma exaustiva investigação sobre o caso assinando o documento “85 mortes... 85 causas”.

.............e nada!

Existiram e existem acusações formais de grupos terroristas como Hezbollah, responsáveis pelo planejamento e ações de atentados por diversos motivos: políticos, religiosos, econômicos ou aqueles relacionados com a negação de transferência de tecnologia nuclear entre Argentina e Iran como o comércio de radioisótopos.

Não foi o suficiente que anteriormente, em março de 1992, um outro homem-bomba chocou o seu veiculo carregado de explosivos contra a embaixada de Israel em Buenos Aires provocando a sua destruição e também a de uma igreja católica e um prédio escolar.

Morreram neste atentado 29 pessoas, várias delas crianças, e ficaram feridas 242, sendo o ataque mais mortal contra uma missão diplomática israelense no mundo até então.

Tal foi a impunidade que apenas dois anos depois aconteceu o atentado da AMIA.

Foi necessário até que um procurador da causa da Amia como Alberto Nissman morresse no meio das investigações.

Foram necessários infinitas palestras, encontros judiciais, viagens de peritos, reconhecimentos de fatos acontecidos e inventados, trocas de equipes de investigadores, fortunas gastas, milhares de discursos sentidos e não sentidos, politizações aproveitadas por muitos, enfim... e os culpáveis ainda livres e as causas ainda abertas....

Foram 85 pessoas que morreram por estar ali, naquele dia, naquele momento, minutos antes das 10 da manhã.... às 9:53 exatamente... fazendo seu trabalho dentro da AMIA (Associação Mutual Israelita Argentina), onde existe a maior comunidade judaica de América Latina (hoje aprox. 230 mil) ou andando pela Rua Pasteur, indo o voltando de algum lugar.

NÃO é suficiente uma expressão como o Nunca Mais... se isso não estiver acompanhado de uma ação que ajude a evitar os atentados e que claramente possa encontrar e condenar culpáveis.

Também é fundamental que existam ações claras para desmistificar as ignorâncias, manter viva a memória de tudo aquilo que não deve acontecer debaixo de nenhuma circunstância em nenhum lugar do planeta, ações que ajudem a compreender que as diversidades colaboram com a evolução humana.

De todas as pessoas aprendemos que somos todos necessários na causa mundial, que ideias não se eliminam destruindo pessoas nem lugares, que a luta por um mundo melhor se constrói a cada dia e que nessa construção são tão importantes as abelhas como as pessoas de todas as idades.

Para este triste 28o aniversario se finalizou e se apresentou o “Passeio da Memória” que começa na Estação Pasteur de Metrô e que de agora em diante será denominada estação Pasteur-AMIA, até o Hospital das Clinicas onde foram trasladados a maioria das vitimas do atentado.

Neste “Passeio da Memória” de várias quadras existem árvores plantadas lembrando cada um que nos deixou, cartazes informativos sobre o que aconteceu e murais ilustrativos que podem ser visualizados de muitos lados, pintados com esse único fim: “deixar uma Memória Ativa para sempre”.

Clicando aqui, é possível assistir ao vídeo em espanhol sobre o Passeio da Memória. 

A Esh Ta Na Mídia acompanha esta homenagem com o vídeo da lembrança, especialmente criado para este novo aniversário e interpretado por duplas de pais cantores e intérpretes com seus  filhos ou netos com a ideia judaica de transmitir e manter “a chama ativa de geração em geração... le dor vador” - clique abaixo:

https://www.infobae.com/sociedad/2022/07/05/el-video-de-amia-que-reunio-a-conocidos-artistas-y-sus-familiares-para-recordar-a-las-85-victimas-del-atentado/

 

A ideia de solicitar a composição e interpretação da canção pela AMIA foi transmitir esse compromisso pela memória e justiça às novas gerações - porque a memória só seguirá viva se a continuamos transmitindo, se conseguimos continuar contando sem parar o que aconteceu, especialmente às novas gerações que nem tinham nascido quando estes eventos aconteceram.

Elas não podem ter lembranças porque muitos até nasceram depois de fatos que nos marcam como a nossa identidade coletiva. Parte da canção diz:


 

“Por isso cantamos hoje para que ninguém esqueça

Que somos feitos de histórias que muitos querem apagar

A justiça é uma flor que demora para crescer às vezes.

Porem no dia que floresce murcha a impunidade”.


A Esh Ta Na Mídia se soma às homenagens em memória do atentado com seu compromisso semanal de ajudar a combater a discriminação, intolerância e desinformação contra movimentos e atitudes antissemitas.

Finalizemos judaicamente com um Kadish honrando a memória dos 85 e pela vida!


“Yitgadal veyitcadash shemé rabá.

Bealmá di vera chiruté, veiamlich malchuté..."


Shabat Shalom e boa semana a todos!

Marcela Fejes Meyer

sexta-feira, 15 de julho de 2022

VOCÊ SABIA? - A ESNOGA PORTUGUESA DE AMSTERDÃ

 

Por Itanira Heineberg



Você sabia que a sinagoga portuguesa construída pelos judeus lusófonos em 1675 no coração de Amsterdã e até hoje em funcionamento era a maior sinagoga do mundo na época, conhecida como “o Século de Ouro” da Holanda?

 

Considerada uma das mais lindas sinagogas do mundo, o templo construído com jacarandá oriundo do Brasil - presente de Moisés Curiel - e com mobiliário produzido com esta mesma preciosa madeira, apresenta dimensões catedralícias e hoje constitui também uma grande atração turística na cidade.



Esta construção magnífica e suntuosa representa de maneira concreta a liberdade que os judeus vivenciaram na Holanda durante o século XVII e lembra sua importância como comunidade, uma comunidade formada por  judeus prósperos, cultos, honrados e respeitados por seus concidadãos.  

A obra arquitetônica é um monumento da história do ensino e da educação, da luta pela sobrevivência e pela religião em meio à fuga da Inquisição através das mudanças de tradições e valores pelas quais trafegaram os judeus da Península Ibérica: a reorganização e reconstrução de seus conhecimentos e crenças trazidos para a Holanda transformados em uma florescente comunidade.

 


A esnoga - sinagoga em português arcaico - é ortodoxa, onde homens e mulheres sentavam separadamente durante os serviços religiosos; os homens no andar de baixo e as mulheres nas galerias ao alto, tendo o Sefardi como língua litúrgica.



A Grande Sinagoga Portuguesa de Amsterdã foi motivo de grande orgulho para seus frequentadores, pois na Diáspora os judeus não obtinham permissão para construir prédios monumentais.

Egon Erwin Kisch, jornalista checo, afirmou em seu livro de 1934 ”Emigrantes: local de Residência - Amsterdã:

 

 "A Sinagoga Portuguesa não poderia jamais ser descrita como um local negligenciado, instável e escondido que servia de ponto de encontro para imigrantes ilegais - não, muito ao contrário, é uma construção esplêndida, poder-se-ia dizer, mesmo, uma "catedral judaica". Seu interior, sustentado por pilares de granito, ergue-se aos céus, quase o atingindo...".

 

A história teve início em novembro de 1670 quando o rabino Isaac Aboab da Fonseca lançou a ideia de se criar uma sinagoga na cidade. A proposta foi aceita com alegria pelos membros da comunidade Talmud Torá e em 1671 compraram um terreno frente à Grande Sinagoga Asquenazita recentemente inaugurada na rua Houtgracht, no centro do bairro judaico.




Então vem a surpresa:

 

“Para projetar e executar a obra foram contratados dois não-judeus pois, tolerância à parte, os judeus não eram admitidos em várias guildas, associações de artesãos de um mesmo ramo. O trabalho de marcenaria ficou a cargo de Gillis van der Veen, enquanto o arquiteto Elias Bouman, que mantinha laços profissionais e de amizade com membros da comunidade sefardita, seria responsável pelo projeto e execução da obra. Os dois profissionais também tinham colaborado na construção da Grande Sinagoga Asquenazita.”

 

O rabino desta nova Sinagoga foi o próprio Isaac Aboab da Fonseca, o primeiro religioso judeu a pisar no Recife do governo de Maurício de Nassau, durante a ocupação holandesa no Brasil. Após uma dezena de anos em terras brasileiras como rabino da sinagoga Zur Israel, a primeira construída no continente americano, ele regressou à Holanda e sonhou com uma sinagoga no país.

Em agosto de 1675 a esnoga foi inaugurada com solenidade e festividades que duraram 8 dias. Como explicar tamanha grandeza e pompa na cerimônia de abertura de uma sinagoga na Diáspora?

 

Segundo cronistas da época, o Núncio Papal de Colônia, que visitou a cidade um ano após a inauguração, manifestou-se "horrorizado de ver que ao povo judeu era permitido erguer tão esplêndida obra".

 

De lá para cá a sinagoga permaneceu forte e imponente, não sendo bombardeada durante a Segunda Guerra, fato interessante frente às muitas e muitas sinagogas europeias destruídas pelos nazistas.

Fala-se que Hitler a protegeu no intuito de inaugurar ali um museu da cultura judaica perdida.

 

“O salão principal da sinagoga permanece, até hoje, praticamente inalterado. O interior é muito claro, pois 72 grandes janelas permitem a entrada de luz natural, durante o dia. À noite, o salão principal é iluminado por mais de 1.000 velas, em 26 grandes lustres de bronze polido e em castiçais colocados ao longo dos bancos. Esta iluminação permanece até o presente. Os números 26 e 72 foram escolhidos por representar o valor numérico do nome do Criador.”




A Esnoga passou por pequenas reformas, uma em 1850 e outra em 1950 e, atualmente, guarda muita semelhança à construída há 320 anos. Até hoje, não possui luz elétrica nem aquecimento. Nas primeiras décadas do século 20, o edifício foi tombado como Monumento Histórico Nacional e a comissão holandesa encarregada da preservação do Patrimônio Arquitetônico Nacional não permitiu alterações internas, pois segundo sua avaliação, "a Sinagoga Portuguesa é um edifício de tal beleza e com linhas tão proporcionais que nenhuma modificação em seu interior poderia aperfeiçoá-la".



Finalizando nosso texto sobre a esnoga dos lusófonos de Amsterdã, reservamos um detalhe edificante que seria como a cereja em cima de nosso bolo cultural.

“Dentro da Sinagoga Portuguesa há uma rica biblioteca; sua coleção é considerada a mais antiga Biblioteca judaica em funcionamento no mundo.”

 

Um prédio de tamanha importância para guardar os valores religiosos, as tradições e a cultura de um povo também conhecido como “ Opovo dos Livros.”

Sofrendo tantas injustiças, perseguições e mortes patrocinadas pela Inquisição, ao chegar em Amsterdã os judeus portugueses sentiram-se livres para viver segundo os preceitos de sua crença, dedicando-se ao estudo bíblico e da literatura judaica.

 

“Amsterdam tornou-se não apenas centro da maior expressão arquitetônica da cultura sefardita no mundo como também da formação escolar, da erudição, de colecionadores de livros, da cultura bibliotecária e da arte da impressão.”



Esta biblioteca “Ets Haim - Livraria Montezinos” de 20.000 obras de estudos hebraicos e sefarditas alberga valiosos livros de judeus de ascendência portuguesa.

 

Encontrei um pensamento que muito me fez pensar:

Portugal e Espanha, durante o período das grandes navegações e descobertas de novas terras, eram os países mais desenvolvidos de seu tempo no século XV.

Com a expulsão dos judeus de seus territórios e como consequência, o aniquilamento de seus professores, médicos, filósofos, economistas, astrólogos, navegadores e cientistas, estes países vieram a perder muito de sua importância e desempenho na Europa até os nossos dias.

 

FONTES:

http://revista.brasil-europa.eu/140/Sinagoga-de-Amsterdam.html

https://www.conexaoamsterdam.com.br/o-que-fazer-em-amsterdam-um-passeio-pelo-bairro-judaico/

https://www.musement.com/br/amsterda/amsterdam-in-the-golden-age-the-portuguese-synagogue-8963/

http://revista.brasil-europa.eu/140/Biblioteca-sefardita.html

https://domtotal.com/noticia/1373052/2019/07/os-judeus-de-amsterda/

http://www.morasha.com.br/comunidades-da-diaspora-1/a-esnoga-de-amsterda.html


Editorial - Colaboração pelo Futuro Comum

Colaboração pelo Futuro Comum


A construção planetária de um caminho para o desenvolvimento sustentável começa com a primeira Conferência da ONU sobre Meio Ambiente, em 1972 em Estocolmo, e evolui com a própria criação desse Conceito cunhado no Relatório da Comissão Mundial da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (presidida por Gro Brundtland e publicada em 1987 sob o título "Nosso Futuro Comum"). 

As grandes novidades nisso foram a ideia de que é possível progredir ao mesmo tempo em que cuidamos do planeta; não existe esta oposição mas, é claro, há escolhas… e a percepção de que, em palavras simples, “estamos todos no mesmo barco” - nosso planeta é nossa casa comum.

Já se foram 35 anos dessa publicação e esta consciência ainda não está em toda parte e, mesmo onde está, faltam ações que nos levem a uma segurança de que nossa espécie pode seguir tranquila neste planeta. Ele - o planeta - sobreviverá, e as baratas também, mas e nós humanos?

Assim como nenhum homem é uma ilha, tal qual escreveu John Donne,  nenhum país pode enfrentar sozinho o fenômeno global que são as mudanças climáticas. 

Temos fases de retrocesso, de inconsciência (?) com ataques à natureza, como estamos vivendo atualmente aqui no Brasil, mas há também boas notícias e é delas que falo aqui.




Ao contrário da rica biodiversidade, cheia de oportunidades, que temos aqui no Brasil, a premissa - quase fato - de que as implicações das mudanças climáticas no Oriente Médio são catastróficas tem marcado a participação ativa, protagonista, de Israel em ações conjuntas dignas de acompanhamento:


- Fundado em 1994 (ano da paz com a Jordânia!) para proteger a água da região e fomentar projetos para enfrentar as mudanças climáticas, com vistas ao futuro da região, o Ecopeace in the Middle East (Ecoeme) é uma plataforma de colaboração de cientistas ambientais jordanianos, palestinos e israelenses que acreditam no poder da cooperação para resolver os maiores problemas do mundo. 

- Em 2021 o presidente Herzog criou o Fórum Israelense do Clima para reunir soluções e apresentar na COP 27 (Conferência das Partes das Nações Unidas) que acontecerá em CAIRO em novembro próximo. Em maio/22 ocorreu a primeira convenção do Fórum. 

Na abertura do Webinar  “Falando das mudanças climáticas - de Tel Aviv a Sharm el-Sheikh“ nesta semana, o cientista político, membro da Knesset e presidente do Fórum do Clima Dov Khenin disse que no Oriente Médio “focar no conflito regional e não considerar as mudanças climáticas é como brigar dentro de uma cabine do Titanic algumas horas antes dele bater no iceberg; e por outro lado, atacar as questões climáticas guardando o conflito numa caixa não funcionará porque ela vai explodir de maneira inadequada.”

No webinar lembrou-se como a mudança do clima já vem há anos trazendo impactos sociais e geopolíticos na região: os movimentos migratórios em massa em busca de água para sobrevivência são realidade crescente, e o dos sírios há 10 anos influenciaram o que chamamos de Primavera Árabe e trouxeram a terrível guerra de repressão de Assad, com a contribuição iraniana.

Para criar uma resiliência e adequada adaptação regional há várias iniciativas, que buscam combinar compromisso com a paz, estabilidade e prosperidade compartilhadas cooperando em áreas como energia, economia, ações climáticas, preparação para emergências e contraterrorismo: em Março/22 ocorreu no kibbutz Sde Boker, no climaticamente ameaçado deserto, a conferência chamada de Negev Summit que reuniu Israel, Egito, Marrocos, Emirados Árabes Unidos e Bahrein, além dos EUA, os quais, apesar de trazerem expectativas muito diversas para a mesa, começaram a “costurar” importantes ações conjuntas;  em Maio agora, a Declaração 3+1 reafirmou a união de propósitos entre Israel, Chipre e Grécia somados aos  EUA no sentido de colaborar política e ambientalmente, criando até o próximo ano um “roadmap” com entregas tangíveis desta jornada.

O Instituto para estudos ambientais Aravá também estava presente no Webinar na pessoa de seu Diretor Executivo, Dr. Tareq Abu Hamed, primeiro palestino a dirigir uma instituição acadêmica em Israel - eles têm inúmeros programas de cooperação tecnológica entre jordanianos, palestinos e israelenses para fazer frente ao inimigo comum da mudança do clima sendo o mais recente o “uso solar duplo”, ou “dupla colheita do sol” que coloca placas fotovoltaicas (ou “agrivoltaicas”) em dois níveis que trabalham simultaneamente para a agricultura e para pecuária, equilibrando a gestão de energia. Tais instalações já estão ativas no Negev, na Cisjordânia, em Gaza e também em Marrocos. Também com este alcance outra tecnologia solar bem sucedida é para aquecimento de edificações no inverno, que chega a economizar 50% da energia elétrica tradicional. Mas, diz Dr. Abu Hamed, o principal sucesso tem sido a “construção de confiança" que acontece nos múltiplos programas de treinamento, de convivência diária de até 4 meses, cujos estudantes árabes jordanianos e palestinos, são um terço do total, e para o que ele aproveitou para convidar também os egípcios.




Recentemente uma nova vitória: pela primeira vez cidadãos de Gaza puderam nadar nas praias do território, assim como israelenses nas praias do sul de Israel, porque soluções de saneamento estudadas em conjunto e instaladas pelos técnicos locais treinados possibilitaram limpar as águas. 

Um programa da Ecoeme é o acordo regional Verde Azul cujo objetivo é expandir e otimizar o uso da energia solar e da água do mar visando criar uma interdependência regional saudável, promover confiança e promover cooperação enquanto gerencia e mitiga os impactos ao meio ambiente e à segurança. Esta iniciativa ganhou o prêmio de Inovação em Democracia de 2021 no 9o Fórum Mundial para a Democracia , oferecido pelo  Conselho da Europa. 






Há inúmeras outras auspiciosas iniciativas com este enfoque que eu resumiria -  “usar o amargo e azedo limão da concreta ameaça climática para fazer uma limonada que seja doce e nutritiva e ainda, saboreada em conjunto pelos vizinhos!”

Vamos acompanhar e celebrar!


Juliana Rehfeld

segunda-feira, 11 de julho de 2022

VOCÊ SABIA? - Espanhol, uma língua neolatina.

 


Você sabia que o Espanhol - a terceira língua mais usada na Internet e falada por 580 milhões de pessoas - recebeu influência do povo Judeu em sua formação, desenvolvimento e expansão?

Was Spanish born in Jewish waters?

Segundo Mario Eduardo Cohen, escritor, pesquisador e Professor de História diplomado pela Universidade de Buenos Aires, não nos é possível estabelecer a hora exata do aparecimento do Espanhol, ou seja, em que momento foi publicamente reconhecido como uma nova língua, um idioma diferente do Latim.

Os mais antigos textos na variação de uma das línguas românicas que mais tarde seria conhecida como Espanhol datam do século IX, demonstrando que a língua do povo já não era o Latim popular ou Latinório, isto é, uma língua rude e sem refinamento.

Um grande avanço no estudo da língua foi a Escola de Tradutores de Toledo no século XIII e a interferência positiva e incentivadora do rei Afonso X, o Sábio.


Afonso X (1221 Toledo – 1284 Sevilla) com colaboradores em seu escritório real.


Ele criou políticas em benefício da economia e estabeleceu feriados para a população, mas sua maior e mais perene contribuição foi a incansável atuação no “royal scriptorium” por ele criado junto a especialistas encarregados de traduzir e editar textos sob sua supervisão. Os resultados foram trabalhos literários, científicos, históricos e jurídicos.

Afonso X fundou, supervisionou e muito participou da Escola de Tradutores de Toledo, com seus próprios textos em colaboração com um grupo de eruditos Cristãos, Judeus e Muçulmanos no intuito de criar uma grande produção literária o que consequentemente levou a uma ascensão da prosa em língua espanhola.

Praticando ao máximo a tolerância religiosa, ordenou a tradução do Corão, do Talmud e da Cabala para o Espanhol, sendo conhecido como “Rei de Três Religiões”.

Carlos Fuentes afirmou em seu discurso introdutório no III Congresso Internacional da Língua Espanhola em Rosário:

 

“Somos o que somos e falamos o que falamos porque os judeus eruditos da corte de Afonso, o Sábio, impuseram o espanhol, a língua do povo, em vez do latim, a língua do clero, para o editorial de história e leis de Castela”.



E Angel Alcalá ("Judeos Conversos na Cultura e Sociedade Espanholas") propôs o paradoxo de que “o espanhol foi praticamente batizado em águas judaicas”.

Enquanto os muçulmanos escreviam em árabe e os cristãos escreviam na língua de culto da época, o latim, os judeus eram proibidos, por seus costumes, de usar a língua sagrada do hebraico para assuntos cotidianos. Assim sendo optaram pelo Espanhol no exercício de comunicarem suas ideias. Como podemos constatar, no início do Espanhol, os judeus foram os primeiros a escrever na nova língua.

 

O Rei Afonso X, o Sábio, estava ocupado reunindo em Toledo todos os estudiosos judeus que haviam sobrevivido às matanças e perseguições. Os rabinos mais ilustres da Espanha Central reunidos em 1249 sob a proteção do rei Afonso, juntamente com os mais notáveis ​​sábios do cristianismo, criaram obras e projetos científicos.”


Américo Castro, em sua obra “A Espanha na sua História” realça:

 

"A única coisa que interessa agora é deixar bem claro que o Espanhol começou a servir como instrumento de alta cultura graças aos judeus que cercaram Afonso X, e dois séculos mais tarde, a situação permanece a mesma, pois são os judeus e não os cristãos que usam a nova língua para comentários sobre as Escrituras, prosa filosófica e estudos astronômicos.”

 

Sem Tob, um judeu de Carrion de las Countes (Palencia), foi o autor do primeiro tomo de poesia em Espanhol, já no século XIV.

Em seus Provérbios Morais, ano de 1365, encontramos estes versos:

 

“Quando a rosa seca, chega a estação,

ainda tem a água perfumada e rosada, que vale mais.”

 

Em um site da delphypages.live sobre a Literatura Espanhola de seu início até os nossos dias, encontramos o parágrafo abaixo sobre Sem Tob ou Santob de Carrión:

 

“Elementos mais exóticos apareceram no Proverbios Morales (c. 1355) de Santob de Carrión de los Condes em uma versão aragonesa da história bíblica de José, que foi baseada no Alcorão e escrita em caracteres árabes. Baseando-se no Velho Testamento, no Talmud e no poeta e filósofo hebreu Ibn Gabirol, o livro de Provérbios de Santob introduziu a grave sentenciosidade e a concisão aforística da poesia hebraica.”

 

Sem Tob inspirou muitos outros poetas da Espanha e alhures.

Bem mais tarde, já no século XVII, o judeu espanhol fugindo da Inquisição Daniel Levy de Barrios, ou Miguel de Barrios de Amsterdã, segue o exemplo de Sem Tob colocando em versos a distinta geografia da América:

 

Em duas grandes penínsulas nos separamos

Até se juntar ao estranho Istmo:

O australiano é chamado de peruano

E o do norte é mexicano."

 

Este é apenas um dos muitos poetas e escritores sefarditas que continuaram a escrever em Espanhol fora da Espanha. Os escritores judeus de Amsterdã competiram com seus irmãos de Espanha durante o Século de Ouro.

Entre os poetas estabelecidos na cidade de Amsterdã estavam David Cohen de Lara, Miguel de Silveira, Uriel da Costa e os poetas Isabel de Correa e Miguel de Barrios, autor de “Flor de Apolo, Coro de Las Musas” entre outras obras.



Miguel de Barrios, após sua peregrinação por países da Europa e África em busca de segurança e paz, estabeleceu-se em Amsterdã onde produziu seus trabalhos de poeta, escritor e historiador.

O famoso quadro de Rembrandt, “A Noiva Judia” foi um retrato de suas núpcias com Abigail de Pina.


Miguel de Barrios nasceu em Montilla, Córdoba em1635 e faleceu em Amsterdã, 1701.

Fiquei encantada e apaixonada por este assunto sobre a evolução e desenvolvimento da língua espanhola.

Línguas sempre foi um assunto que muito me interessou.

Mas minha indescritível alegria foi descobrir a origem de um de meus quadros favoritos, A Noiva Judia, o qual vim a conhecer em 1974 em um dos inumeráveis museus da Holanda, e do qual guardo uma cópia até hoje.

E a história não para por aqui.

Foi grande a contribuição dos sefarditas já convertidos ao catolicismo à Literatura Espanhola.

Segundo Américo Castro os trabalhos satíricos foram a eles atribuídos: Juan de Mena, Hernando del Pulgar, Rodrigo de Cota, Anton de Montoro.

Na realidade há muito e muito mais a relatar mas como não temos aqui um tratado, vale a pena concluir com este detalhe: uma vez expulsos da Península Ibérica, os judeus criadores da primeira prensa móvel na África e Ásia se anteciparam dois séculos à primeira prensa na Turquia.

Numa conclusão precipitada pois não tocamos no Espanhol de nossos dias, falado em Israel e em quase todo o mundo ocidental, fica-nos a certeza da relação próxima entre os judeus e o nascimento da língua Espanhola!

 

 

FONTES:

Personalidades Judias de Todos los Tiempos- Raul Voskoboinik – FACE BOOK

https://www.miamiarch.org/CatholicDiocese.php?op=Blog_15695109927410

https://www.larazon.es/cultura/historia/20211031/erfhnyaqgrellmp3peta2o4mgm.html

https://www.dn.pt/mundo/portugal-ao-expulsar-os-judeus-deu-mundos-ao-mundo-e-ficou-a-perder-10211135.html

https://delphipages.live/pt/literatura/literaturas-do-mundo/spanish-literature

 


quinta-feira, 7 de julho de 2022

Editorial - A ideia de poder X o poder das ideias


Tempos conturbados estamos vivendo: guerra sem fim à vista, com terríveis consequências que se espalham pelo mundo todo; muitos governos batalhando, mais ou menos republicanamente, para se manterem no poder mesmo com indícios claros de desconfiança em sua capacidade de resolver os problemas do país; crimes de abuso sendo acobertados, crimes de ódio invadindo persistentemente o noticiário da manhã, da tarde e também da noite…

O que está acontecendo com este nosso mundo? 



Onde está a cola que deveria nos manter unidos, cuidando um do outro, e todos cuidando de quem mais precisa de cuidados? 

A religião vê como sua função lidar com isso: diz que D'us é a voz do outro dentro nós, que é D'us quem nos ensinou a amar nossos vizinhos como a nós mesmos, a receber bem o estrangeiro, cuidar dos pobres, da viúva e do órfão, olhar pelo invisível, alimentar o faminto, dar abrigo a quem está na rua e calibrar a justiça com compaixão.

Já a vertente biológica na Teoria da Evolução de Darwin afirma que é o ambiente, por meio de seleção natural, que determina a importância da característica do indivíduo ou de suas variações, e os organismos melhor adaptados a esse ambiente têm maiores chances de sobrevivência, deixando um número maior de descendentes. Ou seja, a competição pelos insuficientes recursos é natural e esperada. Mas mesmo Darwin chega à conclusão de que a civilização evolui em grupos, não ao nível individual, o que sugere que é possível a adaptação e a vitória com colaboração…

Contemporâneo de Darwin, Nietzsche sugeriu que o Ocidente abandonasse a ética judaico-cristã pelo que ele chamou de “vontade do poder”. Mas não há nada original na vontade do poder. Ela existe desde os dias de Caim e seu preço é o banho de sangue perene. Uma grande frase de Nietzsche, frequentemente citada, é: “Quem tem um Porque viver consegue suportar praticamente qualquer Como”. De fato, se temos uma razão, um propósito na vida, a caminho do futuro, conseguimos forças para ultrapassar traumas do passado e sobreviver por entre as dores do presente. Ironicamente, Nietzsche parece ter percebido que o abandono da fé em D'us tende a matar este propósito de vida pois fez seu personagem afirmar que Deus está morto.

Crimes de ódio, com base na fúria do preconceito, sempre ocorreram ao longo da história mas atualmente com a amplificação da comunicação, e da Internet chegamos a dias pesados, absurdos.

A ideologia, especialmente quando se torna fanatismo, é uma poderosa fonte de ódio. A doutrinação ideológica costuma reagir a ódios ancestrais que interessa perpetuar, e a ambições de poder.

O ódio é especialmente grave quando, praticado pelos próprios líderes de sociedades, além de mudar pensamentos e emoções, proclama e prega a condenação moral e a desumanização dos odiados.

É muito grave e prejudicial quando acontece no próprio governo de um país e se manifesta especialmente na educação dos mais jovens. Costuma ser embasado por mentiras ou meias-verdades sobre a história do país e sobre as responsabilidades e causas e causadores dos males presentes que afetam a parte ou o conjunto de sua população. O grupo que sustenta uma ideologia se considera moral e até intelectualmente superior aos demais. Essa superioridade gera ódio e o ódio abriga sempre o desejo de um mundo sem o odiado. O pior de certas ideologias é que também contribuem para o ódio, ao legitimá-lo.

Os processos que mudam o sentimento de ódio são lentos e exigem compreender suas raízes. Definitivamente, o ódio deve ser combatido com compreensão e ação, o que implica reconhecer sua existência, muitas vezes sutil. Não se pode lutar contra o ódio se o consideramos aceitável ou tolerável.

Uma boa educação para combater o ódio deveria nos ensinar a ser sábios mais do que inteligentes, pois o ódio nunca resolve problemas —o que faz é sempre agravá-los e fomentá-los.

O sociólogo Matthew Williams dedicou sua vida a compreender as raízes dos nossos preconceitos, dos mais cotidianos àqueles que terminam em extermínio em massa, e como o temor do desconhecido transforma-se em violência e opressão. 

Combinando neurociência, psicologia, sociologia e economia, seu livro A ciência do ódio, publicado em outubro de 2021, investiga como a raiva permeia a história da humanidade em todos os cantos do mundo desde nossas origens e como podemos, no século XXI, combater novas e velhas formas de preconceito.


Voltando ao crítico Nietzsche, ele disse: “Considerem os estudiosos judeus: todos eles têm a lógica em alta conta, que é para um acordo convincente por força de razões; eles sabem que com isso eles tendem a ganhar mesmo quando enfrentam preconceitos de raça ou classe…”



De qualquer forma o judaísmo é uma grande alternativa para combater o ódio, afirmava rabbi Jonathan Sacks, z’l’. A escolha que a humanidade enfrenta em cada época está entre a ideia de poder e o poder das ideias. O judaísmo sempre acreditou no poder das ideias e este permanece sendo o único meio não violento de mudar o mundo.


Juliana Rehfeld