Aconteceram esta semana muitos fatos, positivos ou negativos, no contexto de Israel.
Positivos como as reuniões de normalização das relações com o Sudão, a abertura de embaixada no Chade, a cerimônia de Memória do Holocausto em Rabat consolidando o papel do Marrocos como ponte para a normalização de relações com o mundo árabe, a extensão por parte do Catar dos vistos para israelenses até o final de 2023 e a nova colaboração da NASA com a agência espacial israelense na missão lunar “Beresheet 2” .
O principal acontecimento negativo tem sido o acirramento, desde a semana passada, da violência entre Israel e lideranças palestinas tanto em Gaza como na Cisjordânia, com ataques e respostas, prenunciando mais um período no qual ao invés do som do diálogo ouve-se o ruído da surdez.
A surdez tem sido um fenômeno global. Nesta semana os ataques da Rússia a alvos civis e preparação para respostas de países da OTAN próximos ou distantes da fronteira em guerra se destacaram no âmbito da surdez.
E a temos ouvido progressivamente, todos nós que prestamos atenção. As crises e conflitos são previsíveis, isto é, os sinais e o estrondoso silêncio da surdez da ausência de diálogos são cada vez mais audíveis e visíveis.
O relatório “Emergency Watch List” do International Rescue Committee já em dezembro apresentou as crises e os conflitos previstos para 2023 e que podem afetar o mundo: leia aqui.
Particularmente para a maior ameaça a nós no planeta Terra, as mudanças climáticas, além dos relatórios do IPCC - 2500 cientistas reunidos na ONU que monitoram regularmente as emissões de carbono e a situação do efeito estufa, existe desde 1947 um mecanismo chamado de Relógio do Juízo Final - Doomsday Clock - que vem ticando, cada vez mais alto, tentando furar a surdez.
A surdez é talvez nosso mecanismo de defesa contra os ruídos cada vez mais insuportáveis das consequências do que fazemos sem pensar no bem comum, apenas visando os próprios e imediatos interesses. Nós quem? Os líderes do mundo que têm nosso voto ou apoio indireto, na mão de quem cada um de nós delega - ou abandona - o peso de decidir nosso futuro comum. Continuarmos a nos defender dos ruidosos sinais não parece ser o mais benéfico dos comportamentos; creio que deveríamos ouví-los e juntos compormos, líderes e comunidades, as melodias que queremos deixar para as futuras gerações.
Neste ponto coloco aqui uma prédica que fiz na Eshtamid na parashá de Shemot:
“Aqui é narrado o nascimento de Moisés e as circunstâncias em que isso ocorre, bem como sua adoção e crescimento junto ao Faraó, como príncipe egípcio; temos a partir daí e na continuidade do texto bíblico toda a sua ascensão, todo o despertar de um líder: a percepção da diversa realidade fora do palácio (da bolha em que cresceu), a visão de um grande problema, a força (divina ou não) da inspiração, do chamado ou da convocação para uma missão; um processo ao longo do qual a dúvida sobre a própria capacidade de atuar passa pelo sentimento de impotência, pelo planejamento em etapas das falas e das ações, pelo amadurecimento através da contínua verificação dos recursos que eram necessários para o cumprimento da missão - processo que passa pela preocupação com o meio e modo de comunicação, sua credibilidade; também a preocupação com a sua representatividade, com sua imagem perante o público a ser impactado pela missão, e passa pelo preparo, em etapas, da postura mais resiliente para permitir levar a missão a cabo….
Assistimos em Shemot, e na sequência, o desenrolar desse processo de empoderamento - para usar uma palavra já gasta mas extremamente adequada - que lá no fim, sabemos, não terá, para o líder, um final realmente feliz. Porque sabemos que, embora a missão maior, a de liberar os hebreus, seja fundamental na criação de um povo com os valores que já se iniciaram com Abraão e conduzí-lo à Terra Prometida, a terra almejada, o líder termina por não usufruir da entrada no novo lar. E ele sai de cena sabendo isso e preparando o povo para ficar bem sem ele.
Puxa! Como é necessário e desejável um (ou uma) líder com esse perfil, com esse desenvolvimento. Que pegue nosso problema em suas mãos, prepare soluções e as proponha para nós, nos ajude a pensar para podermos decidir juntos o caminho a ser percorrido….
Igualzinho aos líderes que temos hoje, não? Quantos líderes assim podemos contar na atualidade? E se já tivemos alguns importantes ao longo da história, temos hoje, na minha opinião, menos do que nunca… e isso apesar de termos vivenciado, e ainda estarmos vivenciando, como humanidade, tantas realidades indesejáveis, tantos problemas carentes de solução, apesar de termos tido tantas oportunidades de aprender com a história.
A parashá desta semana se chama Shemot - nomes - porque começa listando os nomes dos hebreus que chegaram ao Egito e se juntaram a José. Descreve o crescimento quantitativo da população de hebreus e mostra como e porque aqueles nomes se transformam em um grupo de seguidores de um líder, depois em um povo com valores e regras e mais tarde, num exército que se instala em um novo lar.
Penso na verdade que a evolução e o desempenho de um (ou uma) líder de sucesso é fundamentalmente dependente de cada nome da comunidade que lidera, da sociedade ampla que o forma. Depende de cada nome que olha e analisa a realidade a sua volta, se prepara e vota (quanto tem acesso ao voto), cada nome que acompanha e vigia as soluções propostas, cada nome que guarda em suas ações dos valores e das regras construídos e acordados. Todos os nomes - Shemot - são importantes. Seria bom que a cada momento difícil que tenhamos como comunidade, como sociedade ou país, possamos fazer a chamada desses nomes que caminham conosco e perseguem um futuro comum, com os valores e regras nos quais acreditamos.
Podemos e devemos começar a chamada já!
Shabat shalom!"
Juliana Rehfeld
Juliana acontecendo!
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