É bastante comum considerar
o judaísmo como uma cultura em evolução. Uma cultura que congrega várias faces.
A religiosa, a legal baseada em leis e regras de conduta e também uma vasta
literatura de debates e histórias ilustrativas (midrashim) onde opiniões
divergentes são confrontadas. A vida judaica é repleta de momentos comunitários
e mesmo os momentos de introspecção são feitos em comunidade. Há um eterno
aprender a ser um entre todos e não necessariamente ser um corpo comunitário em
que os indivíduos perdem suas identidades.
Este
ano os pesquisadores Katalin Karikó (Hungria, Estados Unidos) e Drew Weissman
(Estados Unidos) foram premiados com base em descobertas de ciência fundamental
que permitiram o desenvolvimento de vacinas efetivas contra COVID-19. As
descobertas básicas permitiram entender como os mensageiros que traduzem
informações contidas no genoma interagem com o sistema imune. Gerar
moléculas de mensageiro em tubos de ensaio não resulta em substâncias que
possam ser usadas para gerar vacinas; assim, os pesquisadores fizeram alterações
que permitissem criar vacinas de baseadas em RNA mensageiros (mRNA). Vamos usar
uma linguagem comum para entender o grande salto! A ideia de uma vacina é
produzir moléculas que se liguem ao vírus e façam com que este não se
reproduza. O RNA mensageiro leva o código para produzir uma proteína
específica, e no caso seria a que impediria o vírus de entrar em uma célula ou
se reproduzir. Então era só fazer com que células de defesa, assim chamadas
quando há uma invasão, recebessem a mensagem para produzir esta proteína
protetora. Mas, quando isso foi feito... a proteína era reconhecida como
estranha e aconteciam várias reações indesejadas. Katlin Karikó estuda este
mecanismo há décadas e desvendou muitos segredos, e Drew Weissman é um
especialista em células de defesa – os dois juntaram esforços pois trabalham na
mesma universidade nos Estados Unidos, e conseguiram mostrar que o mensageiro
(RNAm) pode usar vários enfeites. Na linguagem química alguns radicais que
quando presentes driblam as células de reconhecimento - e a pessoa vacinada não
identifica o mensageiro como um ser estranho, mas como um amigo! Esta
descoberta inédita, completamente fora da caixinha, permitiu que fossem criadas
vacinas de mRNA efetivas. A primeira a ser lançada foi a da Pfizer-Biontech
contra variantes do vírus responsável pelo COVID-19. Seguem vacinas contra
influenza, vírus da Zika, citomegalovírus e contra vírus capazes de gerar
câncer. Fica assim evidente que pesquisadores que buscavam conhecer o além
fronteira estavam prontos para saber que havia chegado o momento de agir e
transformar o conhecimento em algo que fez a diferença no enfrentamento da
pandemia que vivemos em 2020-2021.
Ao longo dos anos nos acostumamos ao fato de que judeus têm dado importante contribuição ao mundo das ciências e mais recentemente no mundo da inovação. Um levantamento feito pela Universidade de Stanford (Califórnia) sobre as universidades não americanas que geraram o maior número de empresas unicórnios nos Estados Unidos aponta a Universidade de Tel Aviv em primeiro lugar, o Technion em segundo e a Universidade Hebraica de Jerusalém em 4º lugar, seguida da Universidade Ben Gurion em 6º, para citar apenas as que estão entre as 10 primeiras do mundo (veja a chamada na nossa newsletter. Não assina? Clique aqui). Unicórnios são empresas que atingem uma valorização de 1 bilhão de dólares em bolsas de valores. Olhando as dimensões territoriais e demográficas de Israel, é realmente um êxito que em muito ultrapassa todos os países do mundo. Um outro ponto interessante é que entre os empreendimentos de sucesso foram distinguidos os formados por cidadãos israelenses, o que inclui árabes cristãos e mulçumanos. Há anos diríamos que faz parte do DNA do povo judeu, mas HOJE quero introduzir um novo conceito. Faz parte das muitas maneiras com que interagimos com o mundo. Muitas vezes pode ser a famosa “chutzpá”, que vou traduzir como uma arrogância e muitas a integração total com a perda de identidade.
Será este um fenômeno ligado ao pendor para negócios, que o mundo antissemita usou para rotular judeus durante séculos, ou será o resultado de uma cultura baseada no questionamento e no debate de ideias? Certamente, o fato do Estado de Israel privilegiar a ciência disruptiva e facilitar a criação de “startups” paralelas ao ambiente universitário é um grande diferencial. E não pode ser deixada de lado o apreço pela diversidade.
Estas
atitudes sendo compartilhadas por muitos é a forma com que contribuímos para
mostrar que o estudo e a curiosidade são essenciais para que o futuro não seja
apenas uma repetição do passado. Com este pensamento positivo, vamos encarar as
contribuições dos que estudam como um alicerce para um futuro de Shalom, Salam,
Paz!
Regina P. Markus
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