17 Tamuz de 5780 ---- 9 de julho de 2020
O dia sucede a noite em um caminhar eterno em que o sol e a lua alternam-se nos céus. Esta afirmação que parece uma verdade imutável tem conotações diferentes no equador, nos trópicos e nos polos, mas todos tomamos este fato como uma verdade inquestionável, assim como sabemos que a duração do dia e da noite muda ao longo do ano. Neste olhar a primavera chega iluminando o inverno, e o verão aquece a todos os recém nascidos, que vão se alimentar com os frutos do outono, que é seguido pelo inverno. Inverno lembra o tempo de espera e de recolhimento para se proteger dos tempos difíceis. E nesta toada encontramos a eternidade, visto que tudo se repete. Mesmo nos dias de hoje, quando estamos unidos a pessoas ao redor de todo o globo terrestre, e muitos presos dentro de suas casas, não deixamos de perceber as mudanças da natureza.
Este ordenamento do tempo torna a vida quase atemporal. O que marca o passar do tempo, o evoluir, é a possibilidade de nos libertarmos de uma rotina que impede a real marcação do tempo.
O judaísmo, como uma concepção de vida, traz em seus costumes uma forma de viver o tempo presente sem esquecer os marcos do passado. A vida plena inclui muitos momentos de rotina e também muitos momentos excepcionais, bons e maus, alegres e tristes, e o judaísmo tem por objetivo abrir espaço a todos. Como está escrito na Torah - ESCOLHA A VIDA - e a vida contém todos os momentos, os tristes e os alegres.
No dia 17 de Tamuz - um dia de jejum - inicia-se um período de três semanas em que são lembrados muitos eventos ao longo da história que poderiam ter acabado com o Povo Judeu e que foram superados - O primeiro evento marcante foi Moisés quebrando as primeiras Tábuas da Lei ao se deparar com o povo adorando um bezerro de ouro. Neste dia, no ano 70, os romanos romperam a muralha que protegia Jerusalém e três semanas depois, no dia 9 de Av, destruíram o 2º Templo. E a história continua unindo motivos para prantear: em 1239, Gregório IX ordenou o confisco e a queima do Talmud; em 1391, na cidade de Toledo, foram queimados mais de 4 mil judeus em praça pública; em 1559, o bairro judeu de Praga foi queimado e saqueado; e em 1944, a população judaica de Kovno foi enviada pelos nazistas para campos de concentração.
Três semanas, em que a alegria e a música ficam um pouco à parte. Mas - e sempre tem um mas - é do regramento deste período de três semanas que podemos entender o que é dar importância à vida. Porque as regras devem ser rompidas quando a alegria for de tal magnitude, que nenhuma das tragédias que aconteceram por milênios podem apagá-las. Se é proibido dar festas, a comemoração da chegada de uma nova vida deve seguir todas as regras normais, com festas, danças e muita alegria. Se é proibido fazer rezas que agradecem pela felicidade de um momento especial, esta deve ser rompida ao chegar novos frutos ou conquistar algo que se buscava por longo tempo. A vida, o presente, tem prioridade sobre a história, e neste contexto fica claro que a vida oscila entre regras rígidas e anarquia total.
E entrando nestes 21 dias que lembram que a vida precisa de ORDEM e ANARQUIA - das pedras e da água - é que continuamos vivendo nestes tempos de pandemia - aqui e alhures - sabendo que viver o dia a dia baseado apenas no passado é morrer um pouco a cada dia, e viver o dia a dia almejando apenas um futuro, é perder a possibilidade de ancorar em portos seguros.
Boa Semana!
Regina P. Markus
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