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quarta-feira, 7 de outubro de 2020

EDITORIAL: O CíRCULO - quando o fim abençoa o início


Simchat Tora - a alegria de recomeçar


A vida judaica e os feriados em Israel seguem o calendário regido pela natureza e pela história do povo judeu. A maioria das comemorações encontra um duplo sentido e tem origem nos tempos bíblicos. Ao longo dos milênios são poucas as datas que vão além da queda do segundo Estado de Israel, quando da conquista de Jerusalém pelos romanos. Uma importante exceção é a festa de Simchat Torá, a alegria da Torá.

Este é o dia, logo após a festa de SUCOT, em que é encerrada e iniciada a leitura da Torá. É o dia em que as sinagogas retiram todos os rolos da arca santa e quando esta é carregada por dançarinos, como se fosse o dia em que o homem tem o direito de assumir toda a sua história e apesar da responsabilidade do ato, o momento é celebrado com muita alegria e muita dança. Dançando é que a Torah é passada de um para o outro. Em algumas comunidades com rito ortodoxo próprio apenas entre os homens, e nas demais entre homens e mulheres.  Alegria comemorada com alimentos doces - muitos devem lembrar das maçãs do amor - hit da década de 1950 - e que depois foi sendo substituída pelos pirulitos coloridos. Atualmente a volta da maçã, para dar um gosto doce, vem ganhando popularidade. 

Reciclar, repaginar, retomar - são palavras muito adequadas para os nossos tempos. No mundo do saber, revisitar, voltar a analisar paradigmas e "verdades científicas" também são consideradas formas de poder avançar além das fronteiras do saber estabelecido.

Simchat Torá - a festa da alegria. O Gaon de Vilna (1720-1797) disse que o "comando: alegrar-se durante as comemorações" (Dvarim 16:14) é um dos mais difíceis da Torá, e podemos dizer um dos mais brilhantes e necessários para que a VIDA suplante as dificuldades, para que nossos corpos possam ultrapassar momentos de extrema privação. Elie Wiesel (1928-2016) lembra como nos campos de concentração nazistas em que esteve havia judeus que imitavam dançar com a Torá no dia de Simchat Torá após o trabalho estafante. Lembrar da Alegria, mesmo quando é imposível senti-la, para poder "Guardar"; preservar o maior bem que temos: a VIDA.

É nesta corrente da vida que no dia de Simchat Torá é lida a última parte da Torá - chamada de "Ve Zot ha Brachá" - "E esta é a benção" que deu Moisés aos Filhos de Israel. Quando aos 120 anos morre olhando para o futuro, e a primeira parashat da Torá - BEREISHIT - No começo - em que a história da criação do mundo é contada.

Em um rolo é lida a última parte e em outro a primeira parte - como se a vida fluísse entre as gerações de forma a sempre ter um novo começo. De forma a prescindir de regras rígidas, de dogmas, de palavras de ordem ou de verdades fora de contextos. Um novo começo que conta duas versões diferentes da história da criação.

Na primeira versão D’us criou ADAM  (Adão), ser da terra, - à Sua imagem - e zachar ve nekeivá bará otam - e feminino e masculino ele os criou. No capítulo 2 da mesma parashá conta-se a mesma história, a história da criação, em uma ordem diferente e no sexto dia é contada a história da serpente e de Eva - CHAVA em hebraico que quer dizer ALEGRIA!

A Torah não é dogmática. Admite muitas leituras e uma forma inesgotável de explicações. Lembra a ciência, que vai interpretando os fenômenos naturais na dependência das técnicas disponíveis a cada tempo. Independente dos conceitos de bem ou mal, de certo ou errado, a possibilidade de manter o foco no conhecimento e na alegria, ensinado com destaque por todas as correntes do judaísmo permite seguir em frente e saber que continuaremos a estudar nos próximos milênios. As bençãos de um conhecimento adquirido servirão de base para a busca de novos horizontes.

Chag Sameach!

Regina P. Markus






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