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quinta-feira, 6 de abril de 2023

CINEMA - Por Bruno Szlak: Amos Gitai

 


O cineasta Amos Gitai nasceu em Israel em 1950, onde seu pai Munio Gitai Weintraub foi um proeminente arquiteto da Bauhaus e sua mãe Efratia Margalit uma intelectual, contadora de histórias e professora. Amos formou-se como arquiteto em Haifa e na UC Berkeley na América antes de se tornar internacionalmente conhecido por seus documentários e longas-metragens sobre o Oriente Médio, o conflito árabe-israelense e a memória pessoal e coletiva. Amos leciona em universidades americanas e também foi o primeiro cineasta a ocupar a Cátedra de Criação Artística no Collège de France. Vencedor de inúmeros prêmios internacionais de cinema de prestígio, bem como da Légion d'Honneur francesa, ele vive entre Paris e Israel.

Quando terminou seu PhD em arquitetura em Berkeley em 1980, Amos deixou a arquitetura de lado e começou a se dedicar ao cinema. Seu primeiro documentário foi sobre uma casa em Jerusalém, que até 1948 pertenceu a um ginecologista palestino, Dr. Mahmoud Dajani. Durante a guerra a família Dajani saiu de casa, e depois da guerra o governo israelense instalou uma família que veio da Argélia. Não bastasse isso, um proeminente economista israelense tirou a família argelina de lá e se instalou ali, transformado a casa de um andar em uma vila de três andares. Para fazer isso, ele teve que trazer trabalhadores palestinos dos campos de refugiados e pedras das montanhas de Hebron. Através desta casa o filme conta a história de Jerusalém e as relações entre israelenses e palestinos.

A trilogia é uma forma artística muito apreciada pelo cinema de arte europeu. Entre as trilogias cinematográficas mais conhecidas do cinema de arte europeu estão a "trilogia da vida" de Pier Paolo Pasolini e a "trilogia do sublime" de Jean-Luc Godard. Não surpreende que dois dos cineastas mais radicais da Europa, também conhecidos por usar a arte como inspiração para seus trabalhos, escolheram a trilogia como seu gênero preferido. Esses diretores, imersos na alta cultura europeia, continuam a tradição europeia do tríptico, organizando seus painéis visuais lado a lado. Também não surpreende que Amos Gitai, o cineasta israelense mais orientado para a Europa, que também obtém mais sucesso de crítica e apreciação na Europa do que em seu próprio país, Israel, tenha escolhido o formato de trilogia em seus filmes, como exemplo Zichron Devarim/ Past Continuous (Israel, 1995), Yom Yom/Day After Day (Israel, 1998) e Kadosh (Israel, 1999), para fornecer um olhar crítico e reflexivo sobre a sociedade israelense contemporânea. Outra trilogia é formada por Kedma (2002), Eden (2001) e Kippur (2000), todos eles sobre os conflitos formativos de Israel. Seus dois últimos filmes (A tramway in Jerusalem, 2018; Laila in Haifa, 2020) fazem parte de uma nova trilogia com um novo filme sendo filmado em Beersheba. Esta cidade está no meio do deserto do Neguev e tem o maior conjunto habitacional de massa, com 250 metros de comprimento, que agora serve como um centro de absorção de imigrantes, muitos da Ucrânia e da Rússia. Toda a história se passa neste edifício, porque este é o último da trilogia cujo princípio são os filmes que são rodados em um único local – o filme inteiro é rodado em um bonde, ou em um bar em Haifa, ou neste conjunto habitacional.

Sua formação como arquiteto se traduz nos filmes na busca entre narrativa e forma. Suas composições de cena e tomadas sempre buscam enquadramentos que remetem a formações arquitetônicas, superpostas a cores quentes em cenas mais vibrantes e pelo uso do plano sequência para que nós nos coloquemos dentro do filme, para que se permita ao espectador ao entrar na sala de cinema, que “entre” no clima do filme. As cenas iniciais de muitos de seus filmes são assim compostas, planos sequencias que duram alguns minutos (em Kadosh e em Kedma).

O trabalho de Amos Gitai é bastante controverso e certamente há aqueles que gostam muito de seus filmes e há aqueles que os deploram. Quando perguntado como seu trabalho era percebido em Israel, ele respondeu:

 

“Algumas pessoas gostam e outras não, o que é normal. Não quero ser consensual, o meu projeto é fazer trabalhos que sejam desafiantes. Não sou religioso, mas a grandeza da Bíblia é que ela não é um texto de relações públicas. Ela diz que o rei mais poderoso, David, foi corrompido. O Profeta Nathan o confronta e diz: “Você, o rei, desejou Batsheba e, como a desejou, enviou seu marido Urias para ser morto na guerra. Você é imoral.” Concordamos com Spinoza que a Bíblia é uma obra humana, e o autor provavelmente até foi pago pela casa davídica e ainda assim o editor-chefe da Bíblia, ele ou ela, decidiu que para o DNA das gerações futuras era importante colocar os textos de forma crítica. Naquela época, os riscos de decapitação eram ainda maiores do que hoje para editores-chefes e autores!”.

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