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quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Iachad (juntos - יחד) - por André Naves: Falstaff

 



          O Zé adorava repetir uma frase do Borges.

Na verdade, eu não me lembro bem.. Parece que era uma que falava que a Verdade é só mais uma espécie de Ficção.

Esse, assim como outros ensinamentos preciosos, era um vibrante rubi em meio aos pedregulhos de meu talento.

Tinha outro também que ele sempre me ensinou. Era meio que um sacerdócio por parte dele: me treinar, me adestrar, me alfabetizar... O escritor é um operário, resmungava naquele sotaque d´Azinhaga.

Pr´escrever a gente senta e´screve...

Scritor, s´cerdot, op´rário...

Mas tem um rubi que reluz com tanta força em meu tesouro de pedras que parece até o Sol se pondo... Sabe aquelas cores meio alaranjadas, vermelhosas, berrantes, já chegando num vinho, e que ofuscam os olhos?

Pens´na minha Jangada de Pedra... Ela que escolhe os rumos que toma! O ´scritor só põe no papel! Ela caminha pr´onde o vento sopra... Personagem é assim. Ele é o patrão. O ´scritor, op´rário. Manda quem pode, obedece quem tem juízo!

Esses dias fomos, Ana Rosa e eu, na ópera Falstaff, ali no Theatro São Pedro. Ele é um exemplo desse senhorio das letras... Começou como um figurante numa peça de Shakespeare. Aos poucos tomou fermento.

É que o Falstaff tem aquele charme de todo barrigudo, beberrão, quando não tá tão perto... É um anti-herói, meio picaresco, que se mete em confusão, mas sai com artimanha e carisma e acaba gerando um elo de afeto...

Sabe o Leôncio do Pica-Pau? Falstaff é meio assim...

Acabou encantando os italianos. Rossini era meio Falstaff, mas quem colocou a ópera na partitura foi Verdi, o compositor da unificação! Um personagem de Shakespeare cantando em italiano é sempre meio pitoresco... Caricato...

E se eu te falar que acontece muito? Parece até que ele fugiu do fog londrino e escolheu uma temporada de Sol, pizza e vinho na bota! Falstaffone!

Personagem é assim, né? É ele que escolhe os rumos e os passos... O escritor precisa de humildade para entender e agradecer. O verdadeiro reconhecimento é esse: sair de cena!

No fim, escrever não é oratória...

É “escutatória”...

Tutto nel mondo è burla!

André Naves

Defensor Público Federal. Especialista em Direitos Humanos e Sociais, Inclusão Social – FDUSP. Mestre em Economia Política - PUC/SP. Cientista Político - Hillsdale College. Doutor em Economia - Princeton University. Comendador Cultural. Escritor e Professor.

Conselheiro do Chaverim. Embaixador do Instituto FEFIG. Amigo da Turma do Jiló.

www.andrenaves.com

Instagram: @andrenaves.def

 

 

 

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