Por Itanira Heineberg
Você sabia
que a sinagoga portuguesa construída pelos judeus lusófonos em 1675 no coração
de Amsterdã e até hoje em funcionamento era a maior sinagoga do mundo na época,
conhecida como “o Século de Ouro” da Holanda?
Considerada
uma das mais lindas sinagogas do mundo, o templo construído com jacarandá
oriundo do Brasil - presente de Moisés Curiel - e com mobiliário produzido com esta
mesma preciosa madeira, apresenta dimensões catedralícias e hoje constitui
também uma grande atração turística na cidade.
Esta
construção magnífica e suntuosa representa de maneira concreta a liberdade que
os judeus vivenciaram na Holanda durante o século XVII e lembra sua importância
como comunidade, uma comunidade formada por
judeus prósperos, cultos, honrados e respeitados por seus concidadãos.
A obra arquitetônica é um monumento da história do ensino e da educação, da luta pela sobrevivência e pela religião em meio à fuga da Inquisição através das mudanças de tradições e valores pelas quais trafegaram os judeus da Península Ibérica: a reorganização e reconstrução de seus conhecimentos e crenças trazidos para a Holanda transformados em uma florescente comunidade.
A esnoga - sinagoga em português arcaico - é ortodoxa, onde homens e mulheres sentavam separadamente durante os serviços religiosos; os homens no andar de baixo e as mulheres nas galerias ao alto, tendo o Sefardi como língua litúrgica.
A Grande
Sinagoga Portuguesa de Amsterdã foi motivo de grande orgulho para seus
frequentadores, pois na Diáspora os judeus não obtinham permissão para
construir prédios monumentais.
Egon Erwin
Kisch, jornalista checo, afirmou em seu livro de 1934 ”Emigrantes: local de
Residência - Amsterdã:
"A Sinagoga Portuguesa não poderia jamais
ser descrita como um local negligenciado, instável e escondido que servia de
ponto de encontro para imigrantes ilegais - não, muito ao contrário, é uma
construção esplêndida, poder-se-ia dizer, mesmo, uma "catedral
judaica". Seu interior, sustentado por pilares de granito, ergue-se aos
céus, quase o atingindo...".
A história
teve início em novembro de 1670 quando o rabino Isaac Aboab da Fonseca lançou a
ideia de se criar uma sinagoga na cidade. A proposta foi aceita com alegria pelos
membros da comunidade Talmud Torá e em 1671 compraram um terreno frente à
Grande Sinagoga Asquenazita recentemente inaugurada na rua Houtgracht, no
centro do bairro judaico.
Então vem a
surpresa:
“Para
projetar e executar a obra foram contratados dois não-judeus pois, tolerância à
parte, os judeus não eram admitidos em várias guildas, associações de artesãos
de um mesmo ramo. O trabalho de marcenaria ficou a cargo de Gillis van der
Veen, enquanto o arquiteto Elias Bouman, que mantinha laços profissionais e de
amizade com membros da comunidade sefardita, seria responsável pelo projeto e
execução da obra. Os dois profissionais também tinham colaborado na construção
da Grande Sinagoga Asquenazita.”
O rabino
desta nova Sinagoga foi o próprio Isaac Aboab da Fonseca, o primeiro religioso
judeu a pisar no Recife do governo de Maurício de Nassau, durante a ocupação
holandesa no Brasil. Após uma dezena de anos em terras brasileiras como rabino
da sinagoga Zur Israel, a primeira construída no continente americano, ele
regressou à Holanda e sonhou com uma sinagoga no país.
Em agosto de
1675 a esnoga foi inaugurada com solenidade e festividades que duraram 8 dias. Como
explicar tamanha grandeza e pompa na cerimônia de abertura de uma sinagoga na
Diáspora?
“Segundo
cronistas da época, o Núncio Papal de Colônia, que visitou a cidade um ano após
a inauguração, manifestou-se "horrorizado de ver que ao povo judeu era
permitido erguer tão esplêndida obra".
De lá para cá
a sinagoga permaneceu forte e imponente, não sendo bombardeada durante a
Segunda Guerra, fato interessante frente às muitas e muitas sinagogas europeias
destruídas pelos nazistas.
Fala-se que
Hitler a protegeu no intuito de inaugurar ali um museu da cultura judaica
perdida.
“O salão principal da sinagoga permanece, até hoje, praticamente inalterado. O interior é muito claro, pois 72 grandes janelas permitem a entrada de luz natural, durante o dia. À noite, o salão principal é iluminado por mais de 1.000 velas, em 26 grandes lustres de bronze polido e em castiçais colocados ao longo dos bancos. Esta iluminação permanece até o presente. Os números 26 e 72 foram escolhidos por representar o valor numérico do nome do Criador.”
“A Esnoga
passou por pequenas reformas, uma em 1850 e outra em 1950 e, atualmente, guarda
muita semelhança à construída há 320 anos. Até hoje, não possui luz elétrica
nem aquecimento. Nas primeiras décadas do século 20, o edifício foi tombado
como Monumento Histórico Nacional e a comissão holandesa encarregada da
preservação do Patrimônio Arquitetônico Nacional não permitiu alterações
internas, pois segundo sua avaliação, "a Sinagoga Portuguesa é um edifício
de tal beleza e com linhas tão proporcionais que nenhuma modificação em seu
interior poderia aperfeiçoá-la".
Finalizando
nosso texto sobre a esnoga dos lusófonos de Amsterdã, reservamos um detalhe edificante
que seria como a cereja em cima de nosso bolo cultural.
“Dentro
da Sinagoga Portuguesa há uma rica biblioteca; sua coleção é considerada a mais
antiga Biblioteca judaica em funcionamento no mundo.”
Um
prédio de tamanha importância para guardar os valores religiosos, as tradições
e a cultura de um povo também conhecido como “ Opovo dos Livros.”
Sofrendo
tantas injustiças, perseguições e mortes patrocinadas pela Inquisição, ao
chegar em Amsterdã os judeus portugueses sentiram-se livres para viver segundo
os preceitos de sua crença, dedicando-se ao estudo bíblico e da literatura
judaica.
“Amsterdam
tornou-se não apenas centro da maior expressão arquitetônica da cultura
sefardita no mundo como também da formação escolar, da erudição, de
colecionadores de livros, da cultura bibliotecária e da arte da impressão.”
Esta
biblioteca “Ets Haim - Livraria Montezinos” de 20.000 obras de estudos
hebraicos e sefarditas alberga valiosos livros de judeus de ascendência
portuguesa.
Encontrei um
pensamento que muito me fez pensar:
Portugal e
Espanha, durante o período das grandes navegações e descobertas de novas terras,
eram os países mais desenvolvidos de seu tempo no século XV.
Com a
expulsão dos judeus de seus territórios e como consequência, o aniquilamento de
seus professores, médicos, filósofos, economistas, astrólogos, navegadores e
cientistas, estes países vieram a perder muito de sua importância e desempenho na
Europa até os nossos dias.
FONTES:
http://revista.brasil-europa.eu/140/Sinagoga-de-Amsterdam.html
https://www.conexaoamsterdam.com.br/o-que-fazer-em-amsterdam-um-passeio-pelo-bairro-judaico/
https://www.musement.com/br/amsterda/amsterdam-in-the-golden-age-the-portuguese-synagogue-8963/
http://revista.brasil-europa.eu/140/Biblioteca-sefardita.html
https://domtotal.com/noticia/1373052/2019/07/os-judeus-de-amsterda/
http://www.morasha.com.br/comunidades-da-diaspora-1/a-esnoga-de-amsterda.html
Sem a Reforma, nunca haveria tal Liberdade. Viva Lutero.
ResponderExcluir