Um empreendimento que envia mais de 650.000 livros judaicos por dia para lares mistos pelo mundo!
Por Itanira Heineberg
Você sabia que Harold Grinspoon, um rico empresário judeu, ao descobrir o número crescente de crianças de lares mistos nos Estados Unidos - cerca de apenas um terço dos filhos destes casais são judeus - resolveu “dedicar sua energia e sua riqueza para ajudar o seu povo”?
Grinspoon, o filantropo do qual a maioria das pessoas jamais ouviu falar, é um rico empresário que falhou em muitos empreendimentos iniciais, um judeu que não frequenta regularmente o shul (a sinagoga) e um disléxico que dirige o maior programa de livros judaicos do mundo. Ao constatar esta verdade, ele afirmou em um e-mail: "Eu ri sobre isso o tempo todo". "Eu era o garoto que lutava com a leitura e a ortografia, mas sempre amei histórias. Quando pensei sobre o poder das histórias e da conversa para transmitir a riqueza da vida judaica, e descobri que havia belos livros infantis judaicos no mercado, vi uma ideia que valia a pena avançar. Se você é empreendedor, encontra maneiras de alcançar seus objetivos."
E então surgiu a iniciativa da fundação de Grinspoon em Agawam, Massachusetts: a PJ Library,
que passou a enviar mais de 650 mil livros infantis todos os meses em sete idiomas para
famílias em 27 países que estão criando crianças judias – da Venezuela à Ucrânia, da Austrália à África do Sul.
Muitas destas famílias devem ter apenas um progenitor judeu e também podem
estar em cidades onde não há mais judeus. É verdade que algumas famílias podem estar
totalmente engajadas na vida judaica, mas muitas relatam que a Biblioteca PJ é sua única fonte
judaica.
Eric Robbins, CEO da Federação Judaica da Grande Atlanta, disse: "A Biblioteca PJ é uma das
ideias mais inovadoras e ponderadas que o mundo judaico já viu. Pense nisso: um presente
da comunidade judaica está chegando todos os meses na minha caixa de correio – com o
nome do meu filho nele, um livro que está se somando a uma crescente biblioteca judaica
em nossa casa. E ninguém está me pedindo dinheiro para isso. É revolucionário. Também
não é julgamento. Você diz que é judeu? Tudo bem, isso é bom o suficiente."
Federação Judaica - Histórias para antes de dormir - Winnipeg
Grinspoon, um homem amante de seu povo, um idealista sonhador que acredita nas
diferenças e diversidades humanas, preocupa-se com o alcance do Judaísmo, suas crenças e
tradições até as casas dos pequenos judeus em suas famílias mistas. Ele quer distribuir as
mesmas histórias a todas as crianças judias independentemente de onde vivam, na esperança
de criar laços comuns para todas.
"Que possamos ter diferentes perspectivas e pontos de vista, e que possamos nos envolver
com nosso judaísmo de maneira diferente, mas ainda lembrar que somos um só povo".
Harold nasceu em 1929 em Newton, Massachusetts, e desde sua infância sofreu muitos
insultos e ações de antissemitismo.
Sua vida na escola também foi difícil por ser disléxico.
“Tudo começou porque eu nasci canhoto", explicou. "E naqueles dias, como uma criança judia,
por alguma razão, você não poderia ser um canhoto. Então minha mãe me obrigou a usar a
mão direita." Isso levou à frustração, raiva, problemas de aprendizagem e problemas
psicológicos. Os pediatras de hoje desencorajam a mudança da mão natural das crianças. A
pesquisa também mostrou que isto pode levar a problemas de aprendizagem e
comportamentais, e também a alterações cerebrais permanentes. Para piorar a situação, seu irmão mais velho, Lester, era um gênio, tornando-se um
psiquiatra após cursar os bancos da Harvard Medical School.
Desiludido com seus infortúnios na escola, ele sentiu que poderia ter bons resultados
ganhando dinheiro quando, ainda pequeno, vendeu com sucesso legumes e ovos para seu pai
e sua tia.
Aos 19 anos perdeu seu pai e tentou várias atividades, nem todas bem sucedidas.
Aos 30, adquiriu uma casa com várias unidades residenciais, consertou-a e a alugou
com êxito. Então comprou outra e outra, criando sua própria empresa, a Aspen Square,
atualmente uma das 50 principais empresas privadas de gestão e investimento imobiliário do
país.
No final do século, foi acometido por um câncer de língua e durante esta longa luta de mais de 20
anos contra a doença pensava na melhor maneira de doar parte de sua fortuna. Ele sabia
que queria retribuir ao povo judeu e pensava:
"As pessoas com riqueza têm que encontrar um lar para sua riqueza – onde se sintam bem em
doar e o que é significativo para elas".
A grande ideia para os livros brotou no Pessach de 2000, na mesa do Seder de seu filho mais
velho e nora Winnie. Como prêmio aficoman (quem encontra um pedaço de matzá
previamente escondido por um adulto), seus netos receberam livros da Livraria Israel em
Massachusetts, e as crianças ficaram entusiasmadas com um livro sobre Ilan Ramon, o
primeiro astronauta israelense, e outro sobre uma garotinha que havia imigrado para a
América. Harold ficou impressionado com a alegria das crianças ao receberem livros judaicos.
“Harold fez a Winnie todos os tipos de perguntas: "Eles gostam de comprar livros? Existem
outros livros judaicos? Onde você os obtém?" Uma semana depois, Harold pediu a Winnie que
lhe comprasse USD 500 em volumes semelhantes. "Eu os trouxe para a casa deles", disse
Winnie, "e ele e sua esposa Diane leram todos". Nesta ocasião, Harold descobriu a Biblioteca da Imaginação de Dolly Parton na NPR e se tornou
um parceiro de financiamento local. Já em 2005 ele criou a PJ Library. Hoje, a Biblioteca PJ nos EUA tem 200 parceiros locais
que ajudam o programa a alcançar as famílias, pagar pelos livros e fornecer programação
adicional. "Gostamos de dizer que custa muito ser tão livre", disse Winnie, que atua como
presidente da Fundação Harold Grinspoon (HGF) e como membro do conselho. Não podemos esquecer o braço israelense Sifriyat Pijama, lançado em 2009, que opera em
conjunto com o Ministério da Educação de Israel.
Em parceria com o Ministério da Educação e
a Price Philanthropies de San Diego, o HGF também administra uma versão para crianças
árabes-israelenses chamada Maktabat al Fanoos (Biblioteca das Lanternas), que é o maior
programa de doação de livros árabes do mundo. Em Israel e no exterior, os livros são
distribuídos na escola e, mais tarde, levados para casa.
Em 2021 o HGF enviou 400 mil livros para crianças israelenses em hebraico e 190 mil em
árabe.
Seguindo a tradição da Torá, que é lida todas as semanas nas sinagogas do mundo, as crianças
de Israel da mesma faixa etária na escola pública recebem os mesmos livros.
Grinspoon orgulha-se de ser um filantropo e dedica com alegria grande parte de sua fortuna
aos pequenos judeus do mundo.
Ele também é um exímio nadador e artista plástico há seis anos, esculpindo em madeira e
utilizando também galhos secos e troncos mortos abandonados na natureza.
Apresentamos abaixo um curto vídeo onde vamos conhecer também o lado artístico e criativo
de nosso Harold Grinspoon:
"Eu amo ser um doador”!
A PJ Library, cujo nome vem da abreviação de "pijama", atende também famlías brasileiras. A Karin Zingerevitz, Diretora da PJ Library no Brasil, fez um vídeo explicando a atuação da organização. Clique aqui para assistir e, quem sabe, se inscrever para receber os livros.
Quero voltar à semana passada, pelo que nela estava contido: em 15 de novembro alcançamos 8 bilhões de habitantes no planeta Terra. Somos todos membros de um condomínio gigante cuja convenção vem criando e infringindo regras há milhares de anos.
Este condomínio não tem um único síndico, uma administração única, mas o construtor, muitos acreditam, vigia de perto o seu desenvolvimento. A gestão sempre foi descentralizada e ao longo do tempo tem havido movimentos, mais ou menos intensos, a favor de ações conjuntas mas, a maior parte do tempo, cada unidade vira suas costas para as outras. De vez em quando, uma unidade invade outra vizinha e o aparente equilíbrio condominial desmorona. Reuniões de condomínio? Sim, movimentadas e barulhentas, mas as decisões seguidas de implementação são muito raras.
Digo aparente equilíbrio porque, de fato, basta um olhar medianamente apurado para ver a desigualdade entre blocos e unidades, de oportunidades e de acesso aos muitos serviços do condomínio. Restaurantes de muita diversidade, Playgrounds educativos se concentram em alguns blocos mas quase não existem em outros; poucos têm a chave das academias ou acesso às piscinas enquanto a maioria produz a comida e todos os objetos necessários para viver no condomínio. A maioria corre de manhã à noite pelas tortuosas alamedas, ocupada em cumprir tarefas que, mesmo pouco remuneradas, os mantêm vivos, eles e suas famílias, e eventualmente darão acesso àquelas áreas de lazer e recreação.
Esta nossa manutenção tem problemas gravíssimos: só 15% dos condôminos têm acesso à água potável e só um quarto dos banheiros têm serviço de esgoto. Cerca de 7,5% de nossos condôminos têm consumo insuficiente de alimentos (“insegurança alimentar”) - mesmo que a produção de comida seja quase suficiente, a distribuição é perversa; 12% de nós ainda não conseguiram unidades dignas para morar - vivem pelos cantos e escadas - e 13% não têm eletricidade… mas estas estatísticas são MÉDIAS globais, ou seja, há muitos blocos em que estes números são muito piores que isso.
Na Reunião de Condomínio do momento, a COP 27, a grande preocupação foi com o crescente e sufocante efeito estufa: nosso jardim floresceu em velocidades variadas e com diversidade deslumbrante mas, por contínuo descuido de tantos jardineiros, muitas ervas daninhas sufocaram os frutos das boas sementes. E quanto mais árvores desse jardim cortamos, além da suja maneira pela qual fabricamos nossos produtos condominiais, mais se acumula o gás carbônico, sem saída, como se estivéssemos em uma caixa fechada. O resultante aquecimento vem aumentando e desertificando grandes áreas do condomínio nas quais plantar qualquer coisa já não é possível.
Esse aquecimento quase inexorável vem causando chuvas e enchentes em estações e quantidades inesperadas, derretimento de milenários glaciares, avanço dos nossos oceanos sobre as praias onde poucos de nós se banham e, pior, com isso ilhas estão para serem totalmente engolidas. O que se discutiu agora na reunião de condomínio é a implementação de soluções efetivas para a real ameaça da mudança do clima, que expõe seus múltiplos e terríveis impactos.
Não teve sucesso mais esta assembleia… alcançamos uma enorme quantidade mas nossos números, nossa fotografia, mostram quanta qualidade estamos longe de alcançar.
Na semana passada também ocorreu um tributo global ao emérito rabino e lorde Jonathan Sacks z’l’ pelo 2o aniversário de sua morte. Espalhados em comunidades por todo nosso condomínio, lemos textos do rabino sobre a Parashá Chaiê Sarah.
Jonathan Sacks também falou de mudança climática. Usou conceitos da ciência para cunhar a expressão Mudança Climática Cultural: “estamos atravessando uma das mais profundas revoluções da história humana e eu a resumo como Mudança Global Cultural. Assim como a mudança na temperatura quebra velhos padrões e muda radicalmente as condições meteorológicas, esta mudança climática cultural vem causando uma série de tempestades no Ocidente que vão virar de cabeça para baixo noções convencionais da fé e do papel que as religiões ocupam na sociedade.” Com a secularização, a ocidentalização e a necessidade de acomodação das religiões para sobreviverem e atingirem camadas mais amplas da sociedade houve desenvolvimentos controversos: “nas últimas décadas metade do mundo se tornou menos religiosa e metade, mais religiosa .”
Em julho de 2017 ele disse: ”acredito que estamos passando por um equivalente cultural das mudanças climáticas e somente quando percebemos isso é que entenderemos as coisas estranhas que têm acontecido no século 21 nos domínios da política e da economia, a deterioração de padrões públicos de verdade, de debate civil, e a ameaça à liberdade de expressão nas universidades inglesas e americanas" (e eu acrescento, porque não, as brasileiras?)… e completou: “isto tem dado substrato a fenômenos mais pessoais como solidão, depressão, e abuso de drogas. Todas essas coisas se relacionam. Se percebermos isso já teremos dado o primeiro passo para uma solução.”
Fenômenos complexos, desafiadores, em meio aos quais temos de nos desenvolver e tomar posições: não dá para fugir. Novamente, temos quantidade mas estamos enfrentando isso com a qualidade que precisamos?
O Prof. Sacks encerra sobre esta mudança climática cultural, esta “loucura dos tempos atuais”, usando uma fala de Woody Allen: “mais do que em qualquer outro tempo da história, a humanidade enfrenta um encruzilhada - um caminho leva ao desespero e pura desesperança, o outro, para a extinção. Bem, vamos rezar para termos a sabedoria de escolher corretamente."
Coroa do Estado Imperial do Reino Unido com o grande diamante Cullinan, da África do Sul, descoberto em 1905, o maior encontrado até então, com 3.106 quilates, do tamanho de um coração humano.
Quem assistiu a série Netflix “The Crown”, com certeza vai reconhecer esta joia!
Por Itanira Heineberg
Você sabia
que um diamante da Coroa do Estado Imperial do Reino Unido foi parar em um anel
de noivado de uma jovem israelense?
O anel com
diamante da família Asscher oferecido à noiva Nynke.
Aqui temos o
relato da trajetória de um diamante gigantesco, famoso, oriundo das minas Premier,
em Pretória, até Londres, Holanda e Israel!
A pedra incrustrada
na parede da mina, brilhante como uma estrela, foi descoberta por Frederick Wells
e batizada de Cullinan - uma homenagem a Sir Thomas Cullinan, o proprietário da
mina.
Naquela mesma
noite, Sir Cullinan vendeu-a ao governador provincial do Transvaal, que a
ofereceu ao rei inglês Eduardo VII, bisavô de Elizabeth II, como presente de
aniversário. Na realidade este ato foi um agradecimento à coroa pela declaração
da independência do novo país, África do Sul.
O monarca
Eduardo ficou preocupado com a viagem do diamante até a Inglaterra, então, para
não ser roubado, montou uma estratégia colocando uma pedra falsa a bordo de um
navio a vapor protegido por um grupo de detetives experientes, enquanto o
verdadeiro Cullinan viajava tranquilamente em um canto comum, em uma caixa
simples na mesma embarcação.
Para realizar
o corte do Cullinan, Eduardo escolheu Joseph Asscher - um artesão reconhecido
mundialmente por ter talhado outro famoso diamante, Excelsior, de 971 quilates.
Joseph era diretor do Asscher Diamond Company de Amsterdã, companhia estabelecida
desde 1854, e estudou a peça por seis longos meses antes de a talhar.
Já na primeira
tentativa, a lâmina de aço quebrou sem ferir o duríssimo diamante. Mas na
segunda empreitada, o diamante partiu-se conforme os planos de Asscher. Ao
acabar a tarefa, Asscher desfaleceu, tomado por uma forte tensão nervosa.
O diamante
Cullinan foi talhado em nove pedras maiores e outras noventa e seis menores,
num total de milhões e milhões de libras esterlinas, entregues à coroa inglesa.
A maior
delas, “Estrela da África”, adornou o cetro do rei Eduardo VII; o Cullinan II,
outra das grandes pedras, foi encravado na Coroa Imperial que agora será usada
pelo Rei Charles III.
Diamantes
Cullinan, do Cullinan I ao Cullinan IX
Joseph
Asscher recebeu alguns pequenos diamantes da família real em pagamento por seu
trabalho e esforços e mais tarde, bem após os horrores do Holocausto que
dizimou milhões de judeus da Europa, uma homenagem da rainha Juliana da Holanda:
A família
Asscher, há anos especializada em diamante em seu melhor corte e aproveitamento,
decidiu que suas gemas seriam passadas de geração a geração pelos homens do clã,
através de anéis de noivado presenteados às suas esposas.
Muitos
membros da família foram deportados e mortos durante o Holocausto, mas
Elizabeth Asscher sobreviveu e milagrosamente conseguiu recuperar duas pedras
regiamente escondidas dos nazistas. Durante 65 anos, ela usou um dos diamantes
em armação de metal barato, em sua nova vida de sionista em Israel.
Sua neta, Shakked
Auerbach, conta a história da avó Elizabeth e seu tataravô Joseph Asscher e relata que seu irmão, ao receber a pedra da avó, ofereceu-a
à sua noiva Nynke depois de colocá-la em uma bela armação com a ajuda de
joalheiros incríveis da rua Sheinkin em Tel Aviv.
Como reza a
lenda, “Vão-se os dedos e ficam os anéis!”
O futuro
continuará esta história, com diferentes percursos para as gemas, especialmente
num momento em que a África do Sul reclama a posse de seus diamantes.
Nestes dias de transição há um olhar muito especial para mulheres - a nossa sociedade tem tido um olhar especial ao gênero feminino. Definição de seus papéis, deveres e qualidades ressoam na mídia e nas academias. Ao longo dos milênios, temos em várias culturas exemplos de mulheres que se distinguem - e como vivemos o presente, ficamos com a impressão que um olhar especial à mulher é um fato novo.
Mas acompanhando a história observamos que sempre ocorrem momentos em que mulheres se destacam.
No judaísmo, desde os escritos bíblicos e depois ao longo de toda a história, há espaços ocupados por mulheres. Esta semana lê-se no Shabat a Parashá "A Vida de Sarah" (חיי שרה). No início é contado que "viveu 127 anos e morreu em Kiriat Arbá, Hebron, na Terra de Canaan". E Avraham, após prantear por sua esposa, pede aos filhos de Het, o cananeu, que doe um pedaço de terra para que a enterre. É mencionado que ele poderia enterrar na caverna de Machpelá, que era uma terra que valia 400 shekels de prata. O texto segue, contando que Avraham pesou e entregou esta quantia e lá foi enterrada Sarah - e no seu tempo, também Avraham.
Uma primeira mulher, cuja história revela vontade própria e sabedoria, mas também rebeldia e beleza. O parágrafo anterior admite muitas outras leituras. A tradução literal do hebraico é: As Vidas de Sara. Muitas vidas dentro de uma só implica na possibilidade de várias mudanças de rumo. Como para muitas mulheres, a vida vai sendo construída não apenas pela sequência de eventos, mas por pontos de ruptura com pontos de inflexão de fácil detecção.
Um outro ponto interessante é a descrição literal de onde viviam: na cidade de Hebron, onde até hoje está localizada a Machpelá. Deixando discussões políticas atuais de lado, esta narrativa e as muitas visitas feitas à tumba de Sarah nos últimos 3000 anos trazem a nítida sensação de continuidade.
Dar continuidade a processos, quer como facilitadoras, como guias ou como agentes de criação, é uma das características encontradas nas mulheres. Pergunto se nos dias de hoje queremos mais? Queremos algo diferente?
Antes de responder a esta pergunta, sigo estudando apenas os primeiros 16 versículos. Na primeira aliá (subida a Bimá para acompanhar a leitura da Torah), vamos avaliar o que escreveu Rashi (רש"י,acrônimo de Rabi Shlomo Yitzhaki - Troyes, 28/02/1040 - 13/07/1105), o comentarista do Tanach. Os comentários mostram a interação entre o imigrante e os nativos e também definem Machpelá como uma casa em que o piso estava acima dela. Bastante literal; e podemos passar horas sendo ajudados por Rashi a decifrar a parte literal do texto. Mas hoje o tema é mulher - e neste contexto não é possível esquecer que as filhas de Rashi foram mulheres que estudaram, escreveram e tornaram-se juízas.
Seguindo em frente ao longo dos milênios encontramos muitas outras mulheres de destaque, e quer hoje em Israel, quer na Galut não são poucas as mulheres judias que se destacam e muitas que, apesar de não estarem expostas a holofotes, têm papel fundamental e disruptivo.
Se isto vale para o mundo judaico também vale para a civilização ocidental. A chamada humanodiversidade também vale para as mulheres. Hoje, há movimentos que buscam igualdade e outros identidade. A mulher está pronta para as muitas atividades e tem que deixar de ser cerceada ou rotulada.
E assim, caminha a humanidade... idas e vindas, avanços e retrocessos, memórias e amnésias.
Mulheres
soldadas em Israel escalam postos mais altos nas unidades de elite
Por Itanira Heineberg
Chefe do
Corpo Blindado do IDF Brig. General Guy Hasson, centro, posa em um tanque com
as primeiras comandantes de tanques femininos do exército. (Forças de Defesa de
Israel)
Você sabia
que o IDF - ou Forças de Defesa de Israel, em português – está começando a
convocar recrutas femininas para unidades de elite previamente não permitidas para
mulheres, e a partir de novembro 2022 as mulheres poderão, pela primeira vez,
tentar a unidade de busca e salvamento de helicópteros, bem como engenharia de
combate?
Em junho
passado o IDF anunciou que ampliaria as ações femininas com mais papéis de
combate para mulheres lutadoras, inclusive em unidades de engenharia de busca e
resgate e combate de elite - além das unidades de infantaria leve de gênero
misto (homens e mulheres), onde algumas já servem.
Agora em
novembro de 2022 as participantes femininas terão a oportunidade de realizar
diferentes exames físicos e mentais, especiais, que lhes permitam atuar em
posições de combate nas Unidade de Busca
e Salvamento 669 e Unidade de engenharia de combate, Yahalom.
Desde a
criação do Estado de Israel, em 1948, o serviço militar foi mandatório para os homens
israelenses - que servem por dois anos e oito meses - e também para as mulheres
– que servem por dois anos. No entanto, algumas unidades exigem que os soldados
permaneçam tempo maior do que o obrigatório, em consequência dos longos
períodos de treinamento.
Na Cúpula de
Ferro, mecanismo considerado uma unidade de combate, mulheres e homens servem
juntos assim como na Força Aérea, nas unidades de defesa.
Tem havido
muitos debates e dúvidas quanto à participação de soldadas em papéis de alto
risco e pressão psicológica, e uma decisão em junho último foi finalmente tomada
após recomendações de um comitê interno que intimou os militares a abrir novos
papéis de combate para candidatas mulheres.
Em 2020
quatro recrutas mulheres solicitaram ao Superior Tribunal de Justiça o direito
de tentarem as unidades de combate, direito este tão somente reservado aos
homens até então. Um comitê foi assim formado para estudar a integração
feminina em funções adicionais de combate nas forças armadas.
Seguindo os
passos do processo, agora em novembro o sonho de muitas jovens soldadas poderá
se realizar. Aquelas que não passarem nos testes terão a chance de tentar
outros postos mistos de combate, onde as mulheres já atuam.
O alistamento
de mulheres soldadas em unidades de elite até agora proibidas à ala feminina
será um teste decisivo para o planejamento militar decidir no futuro a sua
aceitação e talvez implementação, dependendo do sucesso dessas unidades.
É preciso
muita coragem e vontade de ajudar o seu país. É preciso paciência e abnegação
ao dedicar dois de seus melhores anos à pátria. Quando estou em Israel sempre fico
fascinada com estas jovens e com os rapazes também, que mantém sua terra
resguardada e protegida, enquanto todos vivem, enquanto todos dormem, eu e
minha família inclusive. Encanto-me ao ver aquelas ainda meninas, em seus
uniformes e armas, seus longos cabelos, louros, pretos, castanhos, encaracolados,
presos de maneira a não incomodar seus movimentos rotineiros, a caminhar pelas
cidades ou vilas, andar nos ônibus e em outros transportes públicos, vivendo
uma vida normal, uma vivência inusitada para qualquer outra jovem de diferente nação.
Em 1897 as mulheres judias
participantes do Segundo Congresso Sionista em Basel, Suissa, já votaram expressando
suas ideias em relação ao território em questão enquanto na França, só em 1944
as mulheres lá votaram pela primeira vez.
E o que dizer
das mulheres israelenses que, aliadas a outras de crenças e tradições
diferentes, cantam pela Paz em busca de dias mais tranquilos para seus filhos e
descendentes?
No passado
aqui já contamos a história de Yael Deckelbaum com mulheres israelenses e
palestinas, atuando unidas em prol da Paz.
Esta cantiga,
Oração da Mães, chegou ao Brasil e sua versão estendida aconteceu em Curitiba.
Abaixo temos
um vídeo de mais de 5 minutos com a bela canção em português: Mulheres pela
Paz.
Continuando o
assunto “super mulheres judias”, incluímos aqui algumas que realmente se
destacaram, apresentadas no belo livro de Sabrina Sciama com ilustrações de Ana
Spett:
“Dona
Gracia Mendes Nasi, banqueira influente portuguesa, que fundou um estado
judaico na Terra Santa cerca de 500 anos antes da criação de Israel;
A
cientista britânica Rosalind Franklin, que ajudou a desvendar um dos maiores
mistérios da ciência moderna;
Marthe
Cohn, uma espiã francesa que descobriu segredos que permitiram aos aliados
vencerem a Segunda Guerra Mundial;
Clarice
Lispector (escritora); Antonietta Feffer (ativista social), Estee Lauder
(empreendedora), Judith Resnik (uma das primeiras astronautas mulheres), Ada
Yonath (Prêmio Nobel de Química), Ruth Bader Ginsburg (juíza do Supremo
Tribunal americano), Agnes Keleti (medalhista olímpica), Natalie Portman (atriz
e ativista social), e das inesquecíveis Golda Meir (primeira ministra de
Israel) e Anne Frank (escritora).”
Mulheres
rabinas, poetas, músicas, mulheres tentando praticar o famoso mantra do Tikum Olam, isto é, consertar o
mundo!
E assim
chegamos ao nosso grupo que criou o blog Esh Tá Na Mídia depois de três anos de
pesquisas sobre como combater o antissemitismo crescente no mundo, em pleno
século XXI.
Somos 4
mulheres procurando mostrar a todos, com clareza e veracidade, a única
democracia do Oriente Médio: Israel - e seus incansáveis esforços para
conquistar um mundo melhor e pacífico para seus habitantes, independente das
diversidades de cada grupo humano.
As editoras,
da esquerda para a direita, Juliana Rehfeld, Regina P. Markus, Marcela Fejes.
E logo abaixo
a campeã Regina Markus, Professora Emérita da USP, recipiente do prêmio do
concurso UN Women USA Rise and Raise Others, na categoria Good Health and Well
Being (Boa Saúde e Bem Estar).
Regina,
grande batalhadora e estudiosa, química, mãe, avó, e super dedicada ao país
Israel, mostra-nos que sim, nós mulheres podemos.
EDITORIAL: A NOITE DOS CRISTAIS (1938) - O ANTISSEMITISMO (2022)
Por Regina P Markus
Na noite do dia 9 de novembro de 1938, adentrando pela madrugada, as ruas de cidades alemãs foram invadidas por turbas que quebravam vidraças e destruíam propriedades. Gritos, insultos e invasões de domicílios. Todo este ódio era dirigido aos judeus, de forma indiscriminada. Era a noite dos cristais. A noite em que os judeus alemães tiveram um anúncio coletivo do que estava por vir.
A noite em que o mundo pode vislumbrar um futuro inimaginável, em que seres humanos seriam destituídos de todas as suas características humanas.
A frase acima pode ser lida de duas maneiras: 1) considerar que os nazistas eram desumanos; 2) considerar que os judeus não eram humanos, portanto deveriam ser exterminados. Nos dois casos, seres humanos são enquadrados em categorias, e a individualidade de cada pessoa é perdida. As origens das famílias são apagadas e apenas o "aqui e agora", o momento em que a turba é teleguiada e é auto-excitada, conta. Um momento que não considera o passado destrói o futuro!
Este ano, o articulista e ativista comunitário Marcos L. Susskind publicou na Revista Kadimah um pedido para que velas fossem acesas no dia 9 de novembro. Um vela, uma lembrança, uma memória: estas são ações que tocam a cada pessoa e não mais ao coletivo de pessoas. Ao chamar indivíduos de judeus, o que os antissemitas fazem é "coisificar" pessoas. Retirar destas seu caráter humano, seu caráter individual, suas particularidades. Assim, não havia distinção entre mulheres, crianças e homens! Todos eram "coisas" a serem varridas, eliminadas. A turba quebrava janelas e vitrines, os líderes e administradores organizavam fábricas de morte e transportavam as pessoas para estes locais. Em 9 de novembro de 1938, 30 mil judeus foram presos em encaminhados para campos de concentração.
O Povo Judeu é um povo disperso há mais de dois mil anos em um exílio imposto pelos romanos. Disperso por todo o globo terrestre, alvo de discriminação coletiva. O nazismo é destacado de forma especial, muito provavelmente por estar tão perto de nós. Foram nossos pais e avós, maridos, esposas e amigos que sofreram diretamente as consequências de um processo de destruição em massa. A mesma geração sofreu outras formas de perseguição na Europa Oriental: pogroms que destruíam aldeias e impediam um vida normal nas cidades. Proibição de viagens e estudos. Tanto a Rússia czarista, quanto a União Soviética foram países em que o antissemitismo era oficializado.
E o que dizer dos judeus que moravam nos países árabes? Estes eram muitas vezes submetidos a condições inferiores e obrigados a pagar pesados impostos. Foram obrigados a deixar grandes fortunas e, é importante lembrar, muitos moravam naquelas terras desde os tempos bíblicos enquanto outros chegaram com a expulsão dos judeus da Espanha e Portugal, em base da Inquisição desenvolvida pela Igreja Católica. Em mais um artigo da Revista Kadimah, encontramos o livro da jornalista e historiadora Lyn Julius, “Desenraizados”, que conta essa parte da história.
Hoje, em pleno século XXI, em todos os cantos do planeta, inclusive no Brasil, vemos crescer a onda de antissemitismo e de discriminação. Esta acontece independente de posicionamento político ou religioso; precede e embasa a enorme recusa em entender que o Estado de Israel é um estado democrático, de direito, e que tem como cidadãos pessoas judias e não judias, MAS é o Lar Nacional Judaico. Focamos na discriminação dos judeus porque somos uma publicação que surgiu na Chavurá Esh Tamid, mas certamente discriminação contra qualquer coletivo, seja ligado a cor, orientação de gênero, ou mesmo segregação de gêneros tem algumas características comuns. Uma das características que passa por todas é esquecer quem é o individuo para olhar para uma característica coletiva.... as louras, os cegos, o/as baderneiro(a)s.... e podem continuar adjetivando, ou melhor, agrupando pessoas sem levar em consideração suas capacidades e características individuais.
CRISTAIS QUEBRANDO - CRISTAIS TILINTANDO - dois barulhos diametralmente opostos. Um lembra a destruição e outro a celebração. Para encerrar, adentrando a madrugada do dia 9 de novembro lembro que...
CRISTAIS QUEBRADOS - A MORTE - A DETRUIÇÃO devem ser lembradas e devem embasar mudanças que possam empoderar o futuro - e para tanto LEMBRAMOS - Izkor - e rezamos o KADISH ATOM - uma reza de santificação que permite circular na fronteira entre a vida e a morte!
CRISTAIS TILINTANTO - ao brindarmos, rezamos o KIDUSH - a santificação da vinha, do vinho, da bebida que consumida com moderação alegra a vida. Mas o excesso leva à perda da capacidade de exercer o livre arbítrio, à perda de consciência, a doenças e à morte.
KADISH - KIDUSH - apenas uma letra LEMBRA os que se foram, ou celebra a VIDA - e é nesta pequena diferença que circulamos por estas vidas....
Yad Vashen,
Jerusalém - Ilan Ramon, astronauta israelense morto no acidente da espaçonave
Columbia em 2003 (filho de uma sobrevivente de Aushwitz) e Petr Ginz, jovem
morto em Aushwitz, que sonhava com a Lua e a liberdade.
VOCÊ SABIA que um acidente com o ônibus espacial Columbia, em 2003, trouxe ao mundo a história de um garoto morto pelo Holocausto mais de cinquenta anos antes?
Cultura
é um prato cheio para os amantes das Artes, e Israel propôs-se a alegrar o
mundo com suas exposições pelas grandes e pequenas capitais do mundo no último
mês de outubro. Houve mostras de artes plásticas e visuais, música clássica, jazz e
bandas, televisão, cinema e curtas-metragens, teatro, comemorações locais,
dança, cerâmica, arquitetura, leitura, poesia e culinária. Uma festa
inusitada para todos que participaram e com ela se enriqueceram.
Vamos contar
aqui sobre um filme apresentado em Kaluga, na Rússia, no Festival Internacional
de Cinema Espacial: Ronen Kraus, vice-chefe de missão da Embaixada de Israel na
Rússia, participou do Tsiolkovsky, o famoso festival. Uma vez no
Museu Estadual da História da Astronomia de Tsiolkovsky, Kraus foi recebido
pelo diretor de cinema e presidente do festival de cinema, Igor Ulnikov, e
levado em uma visita guiada pela equipe do museu, onde conheceu uma extensa
coleção de tecnologia espacial.
Assistiu
também à exibição do filme "O Último Voo de Petr Ginz", dirigido por
Sandra Dickson e Churchill Roberts.
Este filme baseia-se
na história verdadeira de uma criança judia tcheca, um gênio, que aos 14 anos
foi levado para Theresienstadt e posteriormente para Auschwitz.
Trailer do filme, narrado por Eva Ginz, irmã mais jovem de Petr, que sobreviveu ao Holocausto.
“Aos 14
anos, ele já havia escrito cinco romances e um diário sobre a ocupação nazista
de Praga. Aos 16 anos, ele produziu 120 desenhos e pinturas, editou uma revista
subterrânea no gueto de Theresienstadt e escreveu inúmeros contos. Ginz foi
morto na câmara de gás em Auschwitz antes do seu 17º aniversário. O filme é
para comemorar e celebrar a memória de Petr, e lembrar os espectadores das
muitas vidas interrompidas pela tragédia do Holocausto.”
Esta história
de Petr não era conhecida do público em geral, até acontecer a tragédia do
ônibus espacial Columbia em 2003.
“O
astronauta israelense Ilan Ramon, membro da missão, carregava consigo o desenho
de Petr, "Paisagem da Lua". A publicidade em torno do voo da Columbia
e sua trágica explosão levou à descoberta do diário de Petr e obras de arte
adicionais e contos em um sótão de Praga. De todos os romances de Petr, apenas
o Alien Pré-Histórico foi encontrado após a guerra.”
Os objetivos
deste festival de filmes espaciais, além de mostrar novidades na exploração
espacial, são relacionar a ciência com a arte popular, melhorar o entendimento
entre especialistas e professionais de cinema no sentido de solucionar
problemas de cultura, ciência e tecnologia.
Dezenas de
filmes sobre o assunto, de mais de 50 países, participaram deste festival.
Petr e Eva antes da guerra
Os pais de Petr e Eva eram professores, estudiosos da língua Esperanto, e ofereceram aos filhos
enquanto puderam uma vida de muito amor, princípios e estudos.
Após o
acidente da Columbia, surgiu na mídia a história dos sete astronautas mortos e
o nome de Petr Ginz, o jovem artista criador do desenho Paisagem Lunar, agora
uma perda. Alguém leu este nome e achou-o familiar.
Algumas
semanas depois, o museu foi contatado por um tcheco, que dizia ter comprado uma
velha casa em um bairro de Praga e, junto com todas as velharias que estavam
guardadas no porão, encontrou alguns cadernos manuscritos assinados pelo mesmo
nome que assinara aquele sombrio desenho da lua. O nome era Petr Ginz - e foi
assim que os diários ex-perdidos-para-sempre de um menino judeu, registrando a
escalada da deportação da população judaica da capital tcheca para os campos de
concentração, saíram da obscuridade. E revelaram como uma criança testemunhou
os fatos acontecerem ao seu redor, nas ruas, no colégio, na própria casa, e os
registrou com a acuidade de um jornalista.
As páginas de
Petr contam da sua rotina e de como a cidade foi se tornando dia a dia um
espaço proibido aos judeus: ruas, quarteirões, transportes públicos, armazéns,
lojas, profissões, moradias, pertences, médicos, remédios, a simples leitura de
jornais. Com apenas 14 anos, Petr fazia parte da força de trabalho da remoção
(perversidade suprema, os judeus eram obrigados a gerir o seu próprio processo
de expulsão e aniquilamento). O jovem Ginz foi encarregado de levar a bagagem
de muitos parentes para a plataforma de onde partiam os trens rumo aos campos
de concentração. Na rígida e bem sucedida metodologia alemã, nem a um guri era
permitido carregar malas sem as devidas permissões legais: como era proibido
aos judeus irem às ruas antes das 6h, e os trens partiam às 5h30, Petr
precisava no dia anterior conseguir um passe que lhe autorizasse a
auto-locomoção no horário vedado (ressalte-se que o direito à bagagem era
apenas um estratagema do governo nazista para que os condenados não soubessem
que o era, e se dirigissem para a morte cordatamente; a bagagem seria
confiscada no embarque pelos SS).
Nos seus
cadernos, Petr discriminou de forma sucinta sua rotina diária e como o cerco
foi se apertando ao redor dos judeus, da sua família e dele próprio. O tom
ameno dos seus apontamentos disfarça a tragédia que o cercava, mas também deixa
claro o seu profundo grau de entendimento. Seus comentários pontuais sobre o
bombardeio aliado e o atentado de maio de 1942, que matou o SS Gruppenführer,
não deixam margem à dúvida. Ele foi capaz de descrever com sobriedade até mesmo
quando recebeu a notícia de que chegara a sua vez de seguir para um campo de
concentração. Sabia também que a expectativa dos pais de que ele voltaria em
breve não procedia. Petr seguiu para Terezin, denominada pelos nazistas
Theresiensdat, onde ficou preso por dois anos, e de lá foi mandado para a morte
em Auschwitz. Theresiensdat era uma exceção entre os campos de concentração.
Era a estas instalações que os nazistas recorriam, quando queriam negar a
existência dos campos de extermínio. A estrutura do campo tcheco permitia a
simulação de que aquele era um espaço de relativa liberdade para os judeus em
confinamento. A Cruz Vermelha foi até o campo para checar como os judeus eram
tratados e aprovou publicamente as condições. Mas foi uma visita arranjada -
não só o campo era uma farsa, como os visitantes eram cúmplices dela. Este selo
de aprovação do campo não evitou que 33.000 prisioneiros saíssem mortos de lá.
Ou que 88.000 fossem de lá para os campos especializados em extermínio. De todo
modo, as condições sui generis da prisão permitiram a Petr escrever e desenhar
enquanto esteve preso. Lá ele viveu junto com outros 50 garotos da mesma idade,
onde chegaram a editar um jornal, "Vedem" (em tcheco, "venceremos").
Toda a sua produção hoje pertence ao Museu do Holocausto e à sua irmã Eva.
Vendo os muitos desenhos deixados pelo jovem Petr, um leitor voraz, é
impossível impedir que seu talento nos emocione - ainda mais por sabermos em
que condições a sua arte intensa, genuína, floresceu. Dói vermos a beleza dos
seus desenhos e termos o conhecimento que logo ele seria assassinado, sem
chances, sem culpa. Ginz foi além, tendo escrito oito livros de ficção
científica, sob inspiração do seu ídolo Jules Verne, antes mesmo dos 14 anos.
Tivesse sobrevivido, teria sido um gênio que iria assombrar a segunda metade do
século XX?
Petr, uma
criança feliz, antes da guerra.
Infelizmente
ele conheceu os sofrimentos dos campos e percebeu que chegara ao fim.
Assim como
ele, o regime alemão genocida acabou com milhões de inocentes, interrompendo
muitas e valiosas vidas.