Nestes dias de transição há um olhar muito especial para mulheres - a nossa sociedade tem tido um olhar especial ao gênero feminino. Definição de seus papéis, deveres e qualidades ressoam na mídia e nas academias. Ao longo dos milênios, temos em várias culturas exemplos de mulheres que se distinguem - e como vivemos o presente, ficamos com a impressão que um olhar especial à mulher é um fato novo.
Mas acompanhando a história observamos que sempre ocorrem momentos em que mulheres se destacam.
No judaísmo, desde os escritos bíblicos e depois ao longo de toda a história, há espaços ocupados por mulheres. Esta semana lê-se no Shabat a Parashá "A Vida de Sarah" (חיי שרה). No início é contado que "viveu 127 anos e morreu em Kiriat Arbá, Hebron, na Terra de Canaan". E Avraham, após prantear por sua esposa, pede aos filhos de Het, o cananeu, que doe um pedaço de terra para que a enterre. É mencionado que ele poderia enterrar na caverna de Machpelá, que era uma terra que valia 400 shekels de prata. O texto segue, contando que Avraham pesou e entregou esta quantia e lá foi enterrada Sarah - e no seu tempo, também Avraham.
Uma primeira mulher, cuja história revela vontade própria e sabedoria, mas também rebeldia e beleza. O parágrafo anterior admite muitas outras leituras. A tradução literal do hebraico é: As Vidas de Sara. Muitas vidas dentro de uma só implica na possibilidade de várias mudanças de rumo. Como para muitas mulheres, a vida vai sendo construída não apenas pela sequência de eventos, mas por pontos de ruptura com pontos de inflexão de fácil detecção.
Um outro ponto interessante é a descrição literal de onde viviam: na cidade de Hebron, onde até hoje está localizada a Machpelá. Deixando discussões políticas atuais de lado, esta narrativa e as muitas visitas feitas à tumba de Sarah nos últimos 3000 anos trazem a nítida sensação de continuidade.
Dar continuidade a processos, quer como facilitadoras, como guias ou como agentes de criação, é uma das características encontradas nas mulheres. Pergunto se nos dias de hoje queremos mais? Queremos algo diferente?
Antes de responder a esta pergunta, sigo estudando apenas os primeiros 16 versículos. Na primeira aliá (subida a Bimá para acompanhar a leitura da Torah), vamos avaliar o que escreveu Rashi (רש"י, acrônimo de Rabi Shlomo Yitzhaki - Troyes, 28/02/1040 - 13/07/1105), o comentarista do Tanach. Os comentários mostram a interação entre o imigrante e os nativos e também definem Machpelá como uma casa em que o piso estava acima dela. Bastante literal; e podemos passar horas sendo ajudados por Rashi a decifrar a parte literal do texto. Mas hoje o tema é mulher - e neste contexto não é possível esquecer que as filhas de Rashi foram mulheres que estudaram, escreveram e tornaram-se juízas.
Seguindo em frente ao longo dos milênios encontramos muitas outras mulheres de destaque, e quer hoje em Israel, quer na Galut não são poucas as mulheres judias que se destacam e muitas que, apesar de não estarem expostas a holofotes, têm papel fundamental e disruptivo.
Se isto vale para o mundo judaico também vale para a civilização ocidental. A chamada humanodiversidade também vale para as mulheres. Hoje, há movimentos que buscam igualdade e outros identidade. A mulher está pronta para as muitas atividades e tem que deixar de ser cerceada ou rotulada.
E assim, caminha a humanidade... idas e vindas, avanços e retrocessos, memórias e amnésias.
Boa semana!
Regina P. Markus
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