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quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Acontece - na ante-sala de Rosh Hashaná

Por Juliana Rehfeld




Quando nos aproximamos do fim de um ano temos a impressão de que tudo que pertence ao ciclo que está acabando, já aconteceu. Como se um período vazio, na verdade cheio de nada, estivesse apenas “cumprindo tabela” até o apito final. 

Penso nisso agora, na ante-sala de Rosh HaShaná que nos levará a 5784. 

Ao contrário desta sensação, neste fim de jogo muita coisa vem acontecendo, pelo menos do ponto de vista da natureza. Ciclones, furacões, temporais, secas, terremoto. E onde? Em alguma região especialmente castigada? Não, espalhados por todo o planeta, claramente mostrando o dedo indicador aos nossos narizes, gritando que precisamos parar de fazer muita coisa do jeito que estamos fazendo. Precisamos mudar. 

E temos que aproveitar exatamente esta oportunidade que se nos apresenta, um período durante o qual possamos mergulhar nas águas profundas do que fizemos neste último ano, ou em anos recentes, e possamos avaliar o que temos construído, por nós mesmos ou colaborando ao nosso redor. Temos sido fiéis aos valores que prezamos, temos honrado a família e os amigos com quem compartilhamos sonhos e obras?  

Na última parasha do ano, Nitzavim, Moisés pede que o povo da aliança feita com Deus fique de pé e se comprometa com a básica missão de não fazer idolatria e de aderir aos mandamentos que são - e aí vem uma importante particularidade do judaísmo, “atingíveis” aqui mesmo, entre os humanos, e “não no céu, no além”. Moisés cita cada segmento da comunidade - líderes tribais, idosos, crianças, servidores, maridos e esposas, estrangeiros e várias ocupações. Há uma clara intenção de incluir a todos. E não só todos que ora estão de pé, mas também quem não está lá naquele momento mas estará no futuro. 

Por isso nossas referências de como devemos agir não podem ser só individuais, na nossa relação com Deus, mas precisam, para “atingir plenamente o potencial do mundo no qual vivemos, o qual recebemos de herança, devemos cumprir juntos estas tarefas, agir juntos” por mais difícil que isso possa parecer. 

O que acontece à minha volta, em casa, na rua, na cidade, no Brasil, em Israel e no planeta é, em grande parte, resultado do que e de como eu tenho agido, individualmente e também com ou mais ainda, contra as pessoas que compartilham este mundo comigo. E como planejo corrigir o que acontece de ruim e que, se eu olhar com cuidado e vontade, percebo que muitas vezes está ao meu, nosso, alcance. 

Esta convocação em Nitzavim, neste Rosh HaShaná que abre as portas para 5784, coincide com o momento mais importante de todas as semanas, o Shabat, quando paramos tudo o que nos “ocupa, nos distrai”, e, se espera, todos e tudo descansam, a terra inclusive.  

Esta é uma coincidência incrível porque amplia, potencializa enormemente a oportunidade de analisar o que acontece e planejar as ferramentas, o ritmo, a equipe de parceiros e as organizações com os quais vamos construir tempos melhores, mais consistentes com aqueles valores que escolhemos honrar. 

E o Shofar tem tocado ao longo deste último mês de Elul para lembrar que é tempo de juntar forças para isso. Em Yom Kipur pediremos perdão porque sabemos que as promessas que construiremos nos próximos 10 dias “terríveis ou temíveis, ou ainda, dias de arrependimento” como são traduzidos do Yamim Noraim entre RoshHaShana e Yom Kipur, não serão todas cumpridas. 

A ideia não é realmente receber absolvição divina ou perdão das pessoas hoje pelo que errei ontem e aí sentir-me aliviado e confirmado no livro da vida do próximo ano. Mas é ser humilde na percepção de que sou menor que o compromisso de fazer tantas correções que a condição de simples humano falível me possibilita.

A ideia é menos de “chorar pelo leite derramado” e mais pela emoção e gratidão pela oportunidade de tentar melhorar, “tornar mais doce“, para mim e minha comunidade estendida, o mundo que queremos continuar compartilhando.

Shaná Tova Umetuká, Shabat Shalom, Chatimá Tová

Um comentário:

  1. Obrigado Juliana, excelente reflexão, perfeita e com clareza sua escrita. Faço meus os seus bons votos de Shaná Tová, que retribuo com amor e todo carinho que você também merece

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