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sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Editorial - Israel, um Templo também da música

 

A Orquestra Sinfônica de Israel. Crédito: David Vinoker


No domingo passado, na noite de 28 de Agosto, a Sala São Paulo recebeu uma das orquestras mais famosas do mundo: a Orquestra Sinfônica de Jerusalém, dirigida pelo maestro Yeruhan Scharovsky e pela solista israelense Daniella Akta, considerada como uma das principais jovens violoncelistas prodígios.

O maestro Sharovsky, um argentino, é conhecido no Brasil pois dirigiu de 1998 a 2004 a Orquestra Sinfônica Brasileira do Rio de Janeiro e criou em 1999 a Orquestra Sinfônica Jovem Brasileira, recebendo o título de “Cidadão Honorário do Rio de Janeiro” por sua contribuição artística, social e cultural, além de ter dirigido mais de 50 orquestras de destaque em mais de 20 países.

Como sempre, o programa se iniciou com o hino Nacional Brasileiro seguido da Hatikwah, o hino de Israel.

A primeira música do programa foi a Abertura do “O Guarani”, de Carlos Gomes. Seguiu-se o Concerto para violoncelo N 4 de Elgar, interpretado por Danielle e a orquestra e claro que foram vivamente aplaudidos.

Com o pedido insistente de “bis” pelo público, Danielle tocou um solo no violoncelo – o famoso “Tico Tico no Fubá” - que levantou a plateia em longos aplausos.

E porque trago este tema?

No dia seguinte, segunda-feira, o maestro, Danielle e mais alguns músicos foram visitar a Favela de Heliópolis onde está a sede a famosa Orquestra Bacarelli... e esta visita me leva a recordar um dos momentos mais marcantes de minha vida.

Em agosto de 2005 eu dirigia o Centro da Cultura Judaica, e com o apoio de diversos patrocinadores trouxemos a orquestra Filarmônica de Israel, com o famoso maestro Zubin Mehta, para duas apresentações na Sala São Paulo.

No dia seguinte à primeira apresentação, fomos também visitar a Orquestra Bacarelli que, aliás, é formada só por crianças e jovens da favela de Heliópolis num programa de formação artística.

Lá chegando encontramos os jovens estudando a 5a sinfonia de Beethoven dirigidos pelo maestro Tibiriçá, que foi colega de Zubin Mehta na Juilliard School. Tibiriçá ofereceu a batuta a Zubin, que naquele momento recusou e ficou observando as crianças tocando - mas uns 10 minutos se passaram e Zubin tirou seu paletó, aproximou-se a Tibiriçá, que entendeu seu gesto e passou a batuta a Zubin que em lágrimas dirigiu os jovens...

No término da obra, vivamente ovacionado por todos os presentes, Tibiriçá apresentou a Zubin Mehta Adriano Costa Chaves, um jovem que na época tinha apenas 17 anos, morador da favela e que tocava contrabaixo.

Zubin, também contrabaixista, pediu para ao jovem tocar e vivamente impressionado, convidou Adriano para se apresentar naquela noite ao naipe de Contrabaixos.....a história continua com Zubin Mehta convidando Adriano para ir a Israel estudar na sua Academia Buchmann-Mehta Institut, que é a academia formadora dos músicos para a Filarmônica de Israel.

Adriano nunca tinha saído de Heliópolis! Agora ia viajar para Israel... outro lado do mundo! Um país com outra língua, outra cultura... um grande desafio para todos envolvidos no projeto.

A coordenadora dos cursos do Centro de Cultura Judaica Cecilia ben David e eu criamos um curso de um ano para que Adriano estivesse preparado para poder enfrentar o seu novo e fantástico destino. Ensinamos Hebraico, ensinamos sobre a cultura judaica, e o que o “novo mundo” mostraria para Adriano.

A despedida foi em Congonhas, já que ele tomou um voo que o levaria ao Rio e de lá a Israel via Madrid, para estudar em Israel e tocar no naipe dos contrabaixos em diversos concertos da famosa Orquestra Filarmônica de Israel.

A Orquestra Bacarelli em peso veio se despedir de seu contrabaixista numa noite inesquecível, já que no salão de Congonhas os jovens tocaram para Adriano diversas músicas, o que emocionou a todos os presentes e levou muitos às lagrimas, inclusive eu.

Israel é um dos países onde diversas orquestras são hoje ícones em todo o mundo - eu diria que Israel é um dos templos do mundo na música.

Falando em templo, me veio à memória uma história de Napoleão e a comunidade judaica: certo dia, Napoleão teve conhecimento de que a comunidade judaica estava de luto e que nas sinagogas os judeus lamentavam, em prantos, um acontecimento do passado.

Napoleão se interessou pelo assunto e lhe foi dito que aquele dia era 9 de Av pelo calendário judaico – o dia no qual, de acordo com a tradição judaica, se lembrava da destruição dos dois Templos de Jerusalém, o primeiro pelos Babilônios em 586 AC e o segundo pelos Romanos em 70 DC.

Napoleão, ao tomar conhecimento da razão do luto, comentou: “ Um povo que chora por seu Templo há tanto tempo merecerá vê-lo reconstruído”.

Há um linha religiosa judaica que pretende reconstruir o Templo em Jerusalém, inclusive com a tradição de oferendas... mas será uma boa reconstruir o Templo em Jerusalém, em nossos dias ou no futuro?

Eu tenho duas colocações (aliás, como um bom judeu!) para esta pergunta:

Um NÃO e um SIM....

NÃO... se você incialmente quiser criar um grupo de judeus que represente todas as linhas religiosas judaicas para estudar esta eventualidade... só isto já criará um pandemônio que dificilmente chegará a um consenso.

Imaginemos, por um instante apenas, que isto tenha sido possível - recriar o grupo de planejamento para desenhar as plantas do terceiro Templo de Jerusalém – para que seja um lugar onde todas as diferentes linhas religiosas judaicas tenham sua representação e tradições... outra hipótese totalmente improvável...

Continuemos a dar asas à nossa imaginação... há um grupo que representa todas as linhas religiosas. Este grupo, imaginemos, chega a um consenso que cada linha tenha a sua representatividade neste Templo... o edifício, ou melhor este complexo de edificações deverá cobrir uma imensa área horizontal, e ao mesmo tempo com incontáveis níveis, ou andares...pois a história da religião de nosso povo foi criada, recriada, reestudada, rediscutida e continua e continuará assim pelo futuro... assim, o NÃO para a criação do terceiro Templo será a melhor solução.

 

SIM... para mim, a reconstrução do Templo de Jerusalém já pode ser entendida através da criação do Estado de Israel. Israel é para mim um Templo, não do ponto de vista físico, mas do ponto de vista institucional judaico.

Os dois antigos Templos de Jerusalém eram a emanação apenas da religião judaica.

Lá os Cohanim, os Sumo-sacerdotes, é que mantinham a relação com a Divindade através de sacrifícios de animais e oferendas de vegetais que todo o povo oferecia.

Hoje, Israel é a aglutinação de todas as linhas religiosas judaicas, e da cultura daqueles para quem a religião não é a prioridade, os assim chamados seculares.

 

SIM, para mim Israel é um Templo, mas um templo onde a Shechiná, a Glória de Deus, continua repousando através da liberdade religiosa para todas as religiões.

Para mim, o Estado de Israel incorporou a explicação do início da Torah, onde Deus criou o ser humano no sentido de ser o Pai de toda a humanidade, e em Israel todas as religiões são livres para serem vivenciadas...

Os judeus mereceram recriar o Templo, recriar Sion, e criaram Israel depois de 2.000 anos de diáspora....

Mas Israel, para mim, é mais do que um Templo religioso; é o Templo da tecnologia agrícola, da medicina, da informática, da música, e muito mais, fonte para toda a humanidade.

 

SIM, Napoleão estava certo... merecemos recriar o terceiro Templo, e Israel é todo Um Templo, e cabe a cada judeu ou judia estar ligado ou ligada e este lugar extraordinário em suas incontáveis fontes de conhecimento para toda a humanidade.

Seja benvinda a Orquestra Sinfônica de Jerusalém, Maestro Sharovski, Daniella Akta e todos os seus músicos!

Shabat shalom!

Le leshana Abá ve Ierushalaim! O ano que vem em Jerusalém!

 

RAUL MEYER


Regina P. Markus, do nosso Comitê Editorial, com a família para a apresentação da Orquestra Sinfônica de Jerusalém


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