Narrativa: Exposição de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos mais ou menos encadeados, reais ou imaginários, por meio de palavras, imagens ou representações.
A
definição encontrada em diferentes dicionários e o ditado popular que define
NARRATIVAS têm dois aspectos fundamentais: o primeiro ligado ao desenrolar dos
fatos, e o segundo dependente de quantas vezes a mesma narrativa é repetida. Ao se contar uma história, os fatos podem ser interpretados ou podem servir de base para
uma ficção. Por outro lado, quando a narrativa é apresentada de forma
jornalística, faz com que seja construída uma “falsa-verdade” que atende aos
objetivos de grupos políticos, ideológicos ou religiosos. Assim, narrar o
desenrolar dos fatos pode levar à formação de opiniões nem sempre decorrentes
dos fatos que realmente aconteceram. A repetição de uma mesma narrativa ao
longo dos anos pode gerar um inconsciente coletivo que mantém um desvio
constante da verdade, mesmo que os fatos básicos se alterem ao longo do tempo.
Em outras palavras, para que uma determinada conclusão seja sempre atingida, os
fatos novos devem se adaptar a esta conclusão.
O
Povo Judeu tem sofrido uma discriminação constante ao longo dos séculos. Muitas
vezes, é fácil identificar como as narrativas que se repetem de forma
consistente ao longo dos séculos são capazes de manter a chama do
antissemitismo acesa e, mesmo sabendo que está sendo transmitida uma
“falsa-verdade”, esta já está primada no inconsciente coletivo. Muitas
pessoas que não têm nada contra judeus acabam entrando nestas armadilhas.
Algumas destas “falsas-verdades” estão circunscritas a pequenos grupos,
enquanto outras estão disseminadas entre diversas culturas.
Entre as “falsas-verdades” mais comuns está a de que todo judeu é rico, ou que todo judeu sabe fazer negócios, ou que todo judeu é inteligente, ou que todo... e elas têm alimentado invejas e desconfianças. Narrativas que atravessam séculos e que devem ser combatidas quando qualquer grupamento humano é estigmatizado. Mais recentemente, com nossa maravilhosa capacidade de comunicação vemos surgir em todos os segmentos de atividades humanas “falsas-verdades”. Um dos movimentos que ganhou muita força a partir dos anos 1990 foi a existência de árabes que teriam uma herança cultural relacionada com a Judéia e a Samária, e a campanha destes ao redor do mundo para que os negócios de israelenses nestas regiões fossem boicotados.
Uma das mais bizarras que escutei foi de um professor visitando uma pequena cidade do sertão nordestino. Lá estava ele conversando tranquilamente com um grupo de pessoas da região muito interessadas em conhecer judaísmo. Eram pessoas que conheciam a Bíblia e que conversavam animadamente sobre diversos fatos, gerando um momento de descontração. Vem então uma pergunta inesperada: um dos presentes queria passar a mão na cabeça do professor para verificar se haviam chifres. O espanto foi geral, mas o professor entendeu o que estava acontecendo. Em algumas versões da Bíblia a palavra hebraica "karnaim" é usada para caracterizar os raios que iluminavam Moisés ao receber as Tábuas da Lei. Karnaim tem dois significados, raios ou chifres. O mesmo acontece em português com a palavra manga. O desconforto gerado pelo pedido inocente e inusitado foi contornado. A narrativa que desqualificava o judeu, a ponto de trazer chifres escondidos entre os cabelos foi explicada, e todos sabemos que esta era uma narrativa muito aceita na Europa Medieval, e o famoso Moisés de Michelangelo possui a tradução errada de karnaim.
Atualmente há uma grande preocupação em desmascarar “falsas-verdades”. Como proceder? Não há receita única, mas uma das mais produtivas é identificar os pontos fracos das narrativas. Para isto, é preciso escutar todas elas e fazer com que as narrativas baseadas em fatos possam ser disseminadas e as baseadas em falsas traduções ou interpretações possam ser desmascaradas.
Felizmente nestes tempos de INTERNET e de grandes encontros
populares, as duas coisas acontecem. E este ano vamos ter várias oportunidades
de lidar com as narrativas verdadeiras e falsas e com o uso de nossa capacidade
de criar "estórias" além da história e com isto gerar sonhos que permitam
vislumbrar um futuro com mais respeito à diversidade humana.
Quem conta um conto aumenta um ponto.
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