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quinta-feira, 27 de junho de 2024

Acontece - O alistamento dos ultra-ortodoxos

Por Juliana Rehfeld



Esta semana  a Suprema Corte de Israel decidiu por unanimidade (15 votos) tornar obrigatório o alistamento militar de cidadãos “ultra-ortodoxos”. Um dos principais argumentos que embasaram esta sentença foi que “é injusta a discriminação entre cidadãos sobretudo quando se trata de manutenção de algo tão precioso quanto a vida”. E mais, “neste momento de terrível guerra, o peso desta desigualdade torna-se ainda mais agudo.”

Esta decisão estava prevista há algum tempo, mas não que fosse unânime. Vinham ocorrendo muitos protestos na rua, reunindo várias centenas de Haredim e interrompendo o fluxo de grandes estradas.

Cerca de 1,3 milhão de judeus ultra-ortodoxos perfazem 13% da população israelense e a previsão é de que alcancem 19% em 2035 devido à alta taxa de natalidade. Em torno de 65000 deles passaram a ser considerados elegíveis ao exército a partir da decisão da Suprema Corte.

A isenção de alistamento para os ultraortodoxos remonta à fundação do Estado de Israel em 1948, quando um pequeno número de acadêmicos notáveis receberam esse benefício. Mas com a pressão dos partidos religiosos politicamente poderosos, esses números aumentaram ao longo das décadas. O tribunal havia pronunciado que as isenções eram ilegais já em 2017, mas repetidas prorrogações e táticas de atraso do governo impediram a aprovação de uma lei substituta. 

O fato é que estas decisões colocam em risco o futuro da base de apoio do atual governo mas, de certa forma, também trazem receios quanto à própria atuação desta nova população no exército. Houve grande aprovação do público em geral e manifestas comemorações por parte da mídia árabe e palestina. 

Dois partidos pertencentes aos Haredim, ou “tementes a Deus” em hebraico, são partes essenciais da frágil coligação do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, mas as amplas isenções do serviço militar obrigatório reabriram uma divisão profunda no país e enfureceram grande parte do público em geral durante a guerra em Gaza. Mais de 600 soldados foram mortos desde o ataque do Hamas em 7 de Outubro. Muitos soldados da reserva estão iniciando sua segunda missão. E cerca de 3000 ultra-ortodoxos já foram convocados.

Esta decisão do Supremo arremata outra, pronunciada em março deste ano, segundo a qual o governo está impedido de manter os subsídios às “yeshivot” (seminários ortodoxos) que são contra o alistamento. 

Os Haredim são contrários ao alistamento porque acreditam que o estudo em período integral é sua principal tarefa. Algumas manifestações de protesto: 

- O rabino sênior do partido Shas comparou o Supremo Tribunal ao Hamas: “Também houve decretos do Faraó e dos romanos”, alegou;

- O Rabino Shlomo Mahfoud exorta a não se alistar no exército – mesmo para aqueles que não estudam a Torá “porque estará se declarando um apóstata”;

- Sobre os juízes que decidiram que os estudantes da Yeshiva deveriam ser recrutados: “já sabíamos a decisão com antecedência, eles não entendem o que é a Torá”;

- Sobre o massacre na fronteira : "O que aconteceu em 7 de outubro veio do céu".


Bem, as decisões da Suprema Corte não caíram do céu. Elas foram resultado - tardio mas ainda oportuno - da percepção humana e abalizada de que era necessário estancar um problema que ameaça a continuidade da Israel fundada em 1948. A perspectiva de manter esses privilégios a uma população em geométrica expansão é explosiva mas é, também, eticamente indefensável. Vai demorar e não será suave implementar estas sentenças mas na minha opinião o caminho foi aberto para um resgate do sonho dos primeiros sionistas, e que venham mais corajosos passos neste sentido. 

Shabat Shalom

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